Título: A Demanda de D. Fuas Bragatela
Autor: Paulo Moreiras
Sinopse: Nascido em Trancoso no dia em que D. Dinis dava os últimos suspiros, D. Fuas Bragatela estava destinado a ser alfaiate, mas nele outros sonhos fervilhavam. Saiu, por isso, de casa muito novo, serviu a vários amos (com quem nada aprendeu senão os rigores da vida) e, depois de muitas peripécias, acabou a combater na batalha do Salado, donde não trouxe honra nem glória, apenas uma fome dos diabos. Arribou seguidamente a Salamanca, fazendo-se passar por licenciado em Medicina, e regressou à pátria com o cheiro da peste colado às narinas. Mas foi então que descobriu a demanda da sua vida: um dos maiores tesouros da Cristandade.
Num romance que constitui um retrato notável do Portugal medieval - e no qual não faltam alcoviteiras que fabricam hímenes, clérigos que vendem pedaços de céu, meirinhos corruptos, estalajadeiros manhosos, donzelas a transbordar de carnes e rapagões esfomeados -, Paulo Moreiras oferece-nos as irresistíveis aventuras de uma personagem quixotesca, na qual existe um pouco de todos nós, portuguesinhos à beira-mar plantados.
Opinião: A história de como decidi comprar este livro não é muito grande, e é de certeza uma história de 99% dos leitores vão achar familiar. Passou-se da seguinte forma: vi o livro, não reconheci o título, mas achei-lhe piada, não reconheci o autor e achei que tinha uma capa espectacular e, por isso, comprei-o. Fim.
Pois é, isto às vezes acontece. O livro até nem é propriamente recente, e a capa que tanta atenção me chamou é um quadro de Pieter Bruegel, o Velho, o primeiro de uma família de pintores flamengos. Esta edição é que é recente, uma espécie de edição comemorativa dos 10 anos do lançamento do livro.
Mas pronto, a moral da história é que bastou uma capa porreira e um título engraçado para eu ficar com uma vontade imensa de comprar e ler o livro. Como disse, de certeza que a maior parte das pessoas que tenha a leitura como costume vai perceber isto.
Adiante, que estou a escrever muito e a dizer pouco. Este livro é escrito na primeira pessoa, pela voz de Fuas Bragatela, que veio a ser Dom, sem saber bem como. D. Fuas decidiu escrever as suas memórias, para que o seu filho soubesse quem ele era e como tinha vivido. Estas memórias estão cheias de peripécias, situações hilariantes e personagens memoráveis.
No entanto, e apesar da narrativa em si ser simplesmente genial e hilariante, a melhor parte deste livro é a escrita. O autor usa uma linguagem que parece mesmo saída de um Portugal medieval, cheia de arcaísmos e palavras... não direi estranhas, mas curiosas. Entre canadas de vinho, gorgomilo, gusano, velhos barbaçanas e outras coisas que tais, a única reacção possível foi ficar deliciado.
Eu que tanto aprecio a língua portuguesa, especialmente quando mete palavras curiosas e expressões engraçadas, tive praticamente 300 páginas de um português divinal, de tom medieval, recheado de expressões e palavras antigas e caídas em desuso... A minha opinião final é que vale a pena ler este livro, nem que seja pela escrita e pela linguagem utilizada.
No que toca a mensagens mais profundas, a sinopse tem razão, D. Fuas é não só português, como Portugal. Aquele espírito de quem quer ir mais longe, mas da forma mais rápida possível, com tanto desenrascanço envolvido e misturado ora com doses brutais de azar ora com quantidades descomunais de sorte... O indivíduo português, de uma forma geral, é assim, um D. Fuas do século XXI. Quer tudo, sem fazer nada, tem sempre esperança que cheguem dias melhores, e vai vivendo, dia após dias, na base do desenrascanço, umas vezes propositado, outras vezes inevitável... No fim disto tudo, espero ter deixado a ideia de que é um óptimo livro que merece ser lido!
1 comentário:
Só não fiquei com vontade de ler, porque já li.
Já li, porque comprei o livro exatamente pelos mesmos motivos que aponta, há uns dias atrás.
E também eu fiquei deliciada com a riqueza da linguagem, pelo ritmo alucinante da sucessão de peripécias e personagens.
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