terça-feira, 26 de março de 2013

A Cidade do Pecado (Sin City #1)


Título: Sin City - A Cidade do Pecado

Autor: Frank Miller
Tradução: Pedro Pires

Sinopse: O primeiro volume da Cidade do Pecado começa como devia começar: com um crime. Marv, feio e bruto como é, não tem muita sorte com as mulheres e quando matam Goldie, a deusa com quem passou uma noite de sonho, decide descobrir o que se passou, fazendo justiça pelas suas próprias mãos. E não vai ser uma coisa rápida e silenciosa, como aconteceu com Goldie. Não, vai ser feio e sangrento e ruidoso!

Opinião: Quando vi o filme baseado neste (e noutros dois) livros, lembro-me de ter reparado no aspecto bastante distinto e forte. Quase completamente a preto e branco, os detalhes de vermelho, amarelo, verde e azul davam-lhe uma intensidade difícil de encontrar noutros filmes, em termos puramente visuais.

A curiosidade para ler os livros era bastante, como podem imaginar. Digo-vos desde já que fiquei ligeiramente desapontado ao início, por não haver cor nenhuma, mas rapidamente me deixei de parvoíces e me rendi à mestria de Frank Miller.

O uso forte e contrastante do preto e branco consegue dar uma expressividade fora do comum não só às personagens como a cada cenário. Um homem num beco escuro é literalmente um homem num beco escuro: não se vê o beco, vê-se um homem rodeado de escuridão, tão perdido e isolado como o estado mental que o levou ao dito beco.

Mas nem só de imagens se faz esta BD, ainda que isso fosse mais do que suficiente. A história é também muito boa, uma história de amor e de vingança brutal, sanguinária, sem qualquer tipo de misericórdia, mas bastante comovente em várias alturas.

E as personagens... Marv, o gigante feio que nem cornos, tem uma força e resistência descomunal, mata pessoas sem sequer piscar os olhos, e também as tortura sem grandes remorsos. Mas não bate em mulheres. E ai de quem se tente meter com aquelas que ele protege. É por isso que matarem Goldie, a loira bombástica, a deusa pessoal de Marv, a mulher que lhe dá uma noite sonho, não é de todo uma boa ideia.

É assim que começa o livro, e o desenvolvimento não podia ser mais violento e espectacularmente brutal, ou brutalmente espectacular, qualquer das hipóteses serve. Não só Marv como também outras personagens, incluindo a própria Goldie, morta desde as primeiras páginas, são personagens tão bem construídas que me pareceram reais. Têm personalidades bem definidas, quase palpáveis. Os casos de Marv e de Goldie são bastante particulares: ele por ter uma personalidade tão improvável e aparentemente inconjugável com a sua aparência e forma de pensar, mas ainda assim tão real; ela por praticamente não aparecer viva e ainda assim ser das personagens de que mais me recordo, em grande parte graças a Marv, que a mantém viva na memória.

A força do livro é imensa por isso mesmo. A história que conta é de vingança, mas do tipo de vingança com o qual toda a gente se consegue identificar e compreender, a vingança por amor. Marv passou uma noite com Goldie e ficou verdadeiramente apaixonado, apenas para a ver a ser morta ao seu lado, enquanto estava inconsciente, de tão bêbedo. Mesmo com Marv a ser um brutamontes cujo primeiro instinto é partir a cabeça de alguém e só depois fazer as perguntas, não acredito que a maior parte dos leitores consiga não torcer por ele. É uma personagem demasiado boa numa história demasiado boa.

Tudo isto e nem sequer falei da cidade em sim, Basin City, mais conhecida por Sin City, que ganha uma vida própria página atrás de página, através dos seus habitantes, muitos deles personificações da própria cidade (ou será a cidade uma objectificação das personagens?) e representantes de uma das suas vertentes, invariavelmente pecaminosas, agressivas e olharem a meios. Marv vê-se envolvido em vários problemas graças à sua demanda pessoal e também pelo simples de estar na cidade em que está.

Porque Sin City é mais do que uma cidade, é um verdadeiro ecossistema moral completamente fechado, com as suas próprias regras e divisões de poder, que dão a ideia de terem nascido de forma orgânica, sem intervenção ou pressão dos seus habitantes. A cidade simplesmente evoluiu de forma natural para o antro brutal e cruel que é. E com ela os seus habitantes fizeram o mesmo. E com ambas as coisas, também a história o faz. É brutal, cruel e algo sádica. As mulheres são todas voluptuosas e andam sempre pouco vestidas, e os homens têm sempre montanhas de músculos que mais parecem deformações ou grandes barrigas e grandes carecas, mas uma coisa é certa: ler sobre Sin City é ir até Sin City e sentir a sua atmosfera. E um livro que consiga fazer isso da forma que este faz não pode ser nada menos do que um excelente livro.

Sem comentários: