segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Scott Pilgrim no seu melhor (Scott Pilgrim #6)


Autor: Bryan Lee O'Malley
Tradutor: Renato Carreira


Opinião: Uma boa forma de encerrar a saga! Um livro maior do que os outros cinco, em que tudo descamba da melhor forma possível. A personagem de Scott continua a irritar-me, foi um choninhas até ao fim, de sorte em sorte, sempre completamente incapaz de fazer o que quer que fosse. Deram-lhe tudo e fizeram tudo por ele. Enfim.

Mas a melhor personagem revelou-se a Kim, que brilha a todos os níveis possíveis neste volume. É a demonstração final de que o Scott Pilgrim é o protagonista porque sim, já que Kim é uma personagem infinitamente mais interessante.

No entanto é de louvar que depois dos últimos livros me terem desiludido ligeiramente, este eleva novamente a fasquia, e até nem me chateava se a saga continuasse. O humor continua parvo, e o surrealismo continua aparentemente aleatório, como bom surrealismo que é, mas a caracterização das personagens ganha um novo fôlego. Esse facto é impressionante por si só, já que muitas delas tinham perdido grande parte do interesse.

Scott Pilgrim no seu melhor é assim uma boa forma de terminar a saga, e que de certa forma consegue compensar a menor qualidade de alguns dos livros ali pelo meio.

sábado, 28 de novembro de 2015

Ler em diferentes línguas

Uma das coisas que mais gosto de fazer é aprender línguas. Além do óbvio português, já sinto o inglês como uma segunda língua, e ando a dar os primeiros passos no alemão. Sei as bases muito bases do mandarim, sei algumas palavras em francês e italiano, e não costumo ter problemas a perceber castelhano.

Mas ler, ainda só leio em português e em inglês. E já noto diferenças significativas. Torna-se fácil de perceber que nos chamem um país de poetas (embora sejamos muito claramente um país de contistas), já que a nossa língua se dá tão facilmente a tantos malabarismos líricos. É possível brincar com o tamanho e o ritmo da frase de uma forma que é impossível em inglês.

Essa língua, mais utilitária, preza as frases curtas e mais directas. O português é construído de metáforas e outras figuras de estilo. É de facto mais fácil escrever poesia em português do que em inglês, já que as nossas frases são tão mais flexíveis do que as dos ingleses/americanos/por-aí-fora.

Nem sequer quero imaginar a desgraça que é traduzir de uma língua para a outra. De inglês para português até pode ser só acrescentar mais pontos finais e parágrafos, mas fazer o caminho inverso é pedir um bilhete para a loucura. Não deve ser fácil para o pobre tradutor que tem de decepar e subdividir algo que, provavelmente, vai deixar de ter o efeito que era suposto.

Mas se há algo que me interessa ainda mais, é falar sobre as línguas que conheço mal. É uma coisa um bocado misteriosa. Como será ler em alemão? Os meus instintos dizem-me que será uma leitura com mais ênfase nas coisas importantes e muito pouca paciência para tudo o resto. E em italiano? Os meus instintos dizem-me novamente que deve ser algo mais melodioso, que jogue imenso com o ritmo.

Só que eu sei lá. E nem quero imaginar como é que um estrangeiro percepciona leituras portuguesas. Muito provavelmente com o mesmo ar com que eu ficaria depois uma leitura em grego: perplexo. Deve ser algo tão completamente alienígena que nem consigo imaginar. No entanto é algo que considero essencial para realmente perceber um livro. Não só lê-lo na sua língua nativa, como estar relativamente à vontade com a língua.

Ler Saramago ou Pessoa ou outro autor lusófono qualquer, mas traduzido para inglês, por exemplo, deve ser uma experiência bem diferente. Claro que a mensagem e o sentido daquilo que se conta passa, se calhar até melhor do que na nossa língua, mas fica a faltar o ritmo, as brincadeiras com as palavras, os tiques sintácticos que nos são tão próprios...

E a mesma coisa para ler inglês (ou outra língua qualquer) traduzida para português. "Once upon a midnight dreary" nem sequer soa bem, quando traduzido, e é o início de um dos poemas mais famosos e mais valorizados da língua inglesa , The Raven, de Edgar Allan Poe.

Não é fácil. E tanto considero um factor importante, o de ler numa língua ou noutra, que ler encaro a leitura de um livro em duas línguas diferentes quase como dois livros diferentes. Já o fiz algumas vezes, e para mim é mesmo como estar a ler um livro diferente.

Portanto torna-se fácil de perceber qual é uma das minhas razões para querer aprender uma série de línguas que não lembram a ninguém, desde o latim e o grego, ao russo e outras que tais. Quero experienciar certas obras na língua em que foram escritas.

Dito isto tudo, e como nota final, fica um grande apreço da minha pessoa pelos tradutoras e pelos tradutores por esse mundo fora, que têm a tarefa ingrata de traduzir o intraduzível, e ainda ouvir os leitores a queixarem-se!

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Uma Viagem à Índia [2/2]: ou como Gonçalo M. Tavares me fez desistir de um livro pela primeira vez em muitos, muitos anos


Autor: Gonçalo M. Tavares


Opinião: Leram bem. Não acabei o livro. Nem consegui chegar a meio, para ser sincero. Fiquei praticamente onde estava desde a última vez em que falei do livro. E entretanto decidi largá-lo e avançar. Algo que eu já não fazia desde que tinha uns... treze anos. Portanto obrigado, M. Tavares, conseguiste fazer-me quebrar um recorde de nove anos.

Questionemos a minha decisão. Como perceberam com o outro texto, não estava nada satisfeito com o que estava a ler. Não me estava a dar o mínimo de prazer, e a partir de certa altura passei a ver o livro como um empecilho que estava entre mim e coisas que valiam a pena ler.

Não foi uma decisão fácil, por um lado, mas foi simples e deu-me um alívio tremendo, por outro. Depois de quase duzentas páginas lidas, ainda me faltavam mais de duzentas. E o que é que eu estava a retirar da leitura? Nada. Já nem o conseguia analisar minimamente, para depois dizer mal (ou bem, ou neutro, ou chamar nomes). Eram apenas palavras numa folha que eu tinha de ultrapassar para chegar a um sítio melhor.

E quando a leitura começa a ser uma obrigação, está na altura de largar. Já não estou na escola, em que era mesmo obrigado a ler as coisas (se bem que nem por isso, já que os professores de português fazem vista grossa aos resumos e livros de análise de afins). Posso decidir o que leio, e quando é que o faço!

Foi então que num momento de rebelião contra os meus próprios princípios, tirei o meu marcador, fechei o livro e arrumei-o na estante. Poucas coisas nos últimos tempos me souberam tão bem. E ninguém me convence de que este autor é uma ilusão. Um tipo com talento, sim senhor, mas incapaz de escrever algo coerente.

Perdoem-me a comparação, a sério, mas Gonçalo M. Tavares, para mim, é uma versão discreta, com escrúpulos e mais intelectualidade, do Pedro Chagas Freitas. Não há volta a dar. o PCF é um aldrabão e nem sequer o considero um escritor, é um idiota que por ali anda a ganhar dinheiro; não digo tanto do M. Tavares. Mas que é mais uma manobra de marketing do que um escritor realmente bom? Sem sombra de dúvida.

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Regresso às Origens (Marvel Salvat #1)


Argumento: J. Michael Straczynski
Arte: John Romita Jr.
Tradução: Paulo Furtado


Opinião: A minha primeira leitura nesta fantástica colecção da Salvat! E logo a começar com uma boa história do Homem-Aranha, que altera a sua origem de forma retroactiva, ainda que introduzindo alguns elementos que não me agradaram por aí além. 

Pelo menos estão pensados e a coisa foi bem feita. Os diálogos estão bons, especialmente as constantes piadas do próprio homem aranha, igual a ele próprio e uma das personagens com uma representação mais consistente nos comics. Acho que nunca vi ninguém a falhar a essência da sua personalidade. Falharem o Peter Parker é o pão nosso de cada dia, mas o Homem-Aranha? Sempre impecável!

O vilão, Morlun, é intenso e consegue ser assustador, e a introdução de Ezekiel, mais um tipo com poderes de aranhiço, levanta mais questões do que respostas, e embora um dos elementos de que eu não tenha gostado muito tenha sido, exactamente, a história que este conta (e que explica a perseguição que Morlun faz aos heróis aranha), a verdade é que toda a conversa dos totems me deixou muito, mas muito curioso.

Por outro lado, é de destacar o próprio Ezekiel, que merecia as suas próprias histórias... tanto potencial num herói que se recusa a ser herói!

No final, a tia May descobre que o sobrinho querido é o homem aranha, e só acho mal que eu vá ter de esperar tanto para descobrir as consequências. Mas é um óptimo começo para a colecção!

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Scott Pilgrim Contra o Universo (Scott Pilgrim #5)


Autor: Bryan Lee O'Malley
Tradutor: Renato Carreira


Opinião: Sem dúvida um dos melhores volumes da saga, se não mesmo o melhor. E porquê? Porque tudo corre mal! Sem Ramona, sem Kim, já sem viver com o Wallace, e fechado fora de casa sem chaves, Scott perde praticamente tudo! Até o baixo! O drama desenrola-se sempre de forma divertida, mas inexorável, e é impossível não sentir alguma pena dele.

Finalmente algo que faz sentido neste mundo quasi-surreal: o inepto do Scott, que não é bom a nada, e que passa os livros todos a evitar fazer alguma coisa e a ser um banana de forma geral, vê-se a braços com uma tragédia. De repente as coisas funcionam como nós estamos à espera no mundo real, e ele perde basicamente tudo.

Já era altura. E assim consegue-se a proeza de tornar a personagem interessante, ao mostrar como é que ele se safa (ou não) da enorme embrulhada em que se meteu. Tudo isto ao mesmo tempo que os namorados maléficos da Ramona continuam a intrometer-se entre os dois, dando origem, como não podia deixar de ser, a algumas cenas de luta verdadeiramente espectaculares.

Algum do melhor humor também está aqui presente, o que faz deste volume, definitivamente, uma boa leitura.

sábado, 21 de novembro de 2015

Não exagerar

Nem sempre se tem grande coisa para dizer. E isso não é mau. Nenhum ser racional pode esperar que todas as pessoas tenham sempre algo de relevante para dizer. Sim, relevante. Dizer alguma coisa é estupidamente fácil. Dizer algo que valha a pena dizer é que não.

Há quem consiga direccionar essas coisas de formas bastante construtivas e úteis para a sociedade. Filmes. Séries. Livros. Outras obras de arte. Trabalho. Princípios de vida. Raramente é fácil, mas são essas pessoas que fazem o Mundo avançar.

E depois há as pessoas que não têm grande coisa a dizer, mas que falam muito. Ou que direccionam os instintos de falar para coisas nada construtivas. Como certos e determinados autores que já deviam ter aprendido que os livros que escrevem não são Testemunhas do Autor, prontos a converter todo e qualquer leitor que lhes passe à frente.

Esses autores, e muita gente, deviam aprender que um corolário essencial da liberdade expressão é o direito a estar calado. E também deviam aprender que é preciso saber quando falar pouco, dizer pouco, e acabar na altura certa.

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Uma Viagem à Índia [1/2]: ou como Gonçalo M. Tavares, um dos mais galardoados autores portugueses da actualidade, é também um dos piores


Autor: Gonçalo M. Tavares


Opinião: Este texto é altamente irregular. Uma das coisas que menos gosto de fazer é opinar a meio de um livro. Posso dizer qualquer coisa, mas nunca uma opinião decente: até chegar à última página muita coisa pode acontecer.

Nas raras vezes em que isto me acontece é por causa de uma de duas razões: ou o livro é extraordinariamente bom (e mesmo assim acabo por me desapontar), ou o livro é extraordinariamente mau (e por esse lado, raramente mudo de opinião). E este, caros leitores, trolls profissionais e pessoas do futuro que andam a ler umas coisas deste blog para descobrirem se sou um psicopata ou não (spoiler: eu é mais sociopatia), este é um livro extraordinariamente mau.

E ainda só li cerca 45%.

Pois é, depois da queixa disfarçada de opinião da Mensagem, sejam bem vindos a mais um relativamente longo rol de queixinhas.

Nem sei bem por onde começar... Tenho tanto por onde pegar... Ah, já sei! Que tal começar por dizer que não li um, dois nem sequer três livros deste autor, mas sim quatro, e ainda um conto e algo inclassificável? Pois é, estou novamente a falar com conhecimento de causa.

"Ainda não tens é maturidade para esta escrita invejável!"

Bons olhos o vejam, Sr. Burro da Silva, como vai? Não quero saber. Nem sequer vou fazer de conta que sou simpático consigo, se vem aqui defender o Tavares, aviso-o já de que vai ser trucidado. Pronto, quando quiser, esteja à vontade. Como eu estava a dizer, não estou a dizer nada vindo do ar, e esta crítica é mais uma vez uma crítica informada.

Como tal, avancemos. Este livro foi vendido como uma homenagem e um sucessor aos Lusíadas, e é isso que tenta transparecer por todos os poros: desde o título à edição em capa dura, que lhe dá um ar mais sério e vetusto. A história tem inspirações desse grande épico, está dividida em cantos e escrita em verso, é verdade sim senhor. Mas em vez de homenagem pensem mais em colagem.

É que dizer que este livro é uma homenagem à epopeia de Camões é como dizer que o próximo filme do Michael Bay é uma homenagem a um atentado terrorista qualquer: sim, ambas as coisas só fazem é mal às pessoas nas proximidades, e sim, são ambas igualmente desprovidas de qualquer sentido, mas tirando isso...

Logo à partida, estar em verso ou não estar é igual ao litro. E é preciso muito descaramento da parte de Tavares para escrever o livro com esta estrutura. Basta lerem umas páginas para perceberem que a única coisa que ele fez de diferente relativamente a escrever um livro em prosa foi carregar mais vezes no Enter ou usar folhas mais estreitas. De resto, o verso, que não tem métrica fixa nem rima regular (ou irregular, nada), não serve para absolutamente. Torna-se insultuoso para a obra original, que é uma autêntica ode à capacidade técnica de Camões.

Na prática é o equivalente a eu escrever um livro de poemas, todos ao meu estilo, e assinar cada um com um nome diferente. Já estou a imaginar, O livro triunfal, a maior homenagem a Pessoa e os seus heterónimos. Só que não. É uma mera decisão estilística que foi feita só porque sim, e que ainda por cima conseguiu ser extremamente mal executada.

Depois o que dizer da "história"? A escrita em si nem me aborrece por aí além - tal como em Pessoa(s), encontro algumas passagens que considero dignas de anotar no meu caderno de citações - mas a completa ausência de história em prol de pregos ideológicos que o autor tenta martelar através do meu crânio... Lamento, mas isso dói que se farta.

"Esta juventude de hoje em dia já não sabe apreciar um livro contemplativo, é o que é. Gonçalo M. Tavares é um dos maiores escritores de sempre, tem uma técnica impressionante e um talento imenso, e as obras que escreve são de uma profundidade que os comuns mortais apenas podem imaginar."

Mas tem toda a razão, Sr. Burro da Silva, pelo menos nas duas últimas coisas que disso: o autor realmente tem um talento que me deixa espantado e desapontado por o ver a ser desperdiçado, e os seus livros são odes à profundidade filosófica. Aliás, se a profundidade filosófica se medisse em metros, ia ser preciso inventar uma nova classe de números para medir os livros do Gonçalo M. Tavares.

E o problema é exactamente esse. Os livros são tão, mas tão, mas tão profundos, que sabem o que é que se vê cá de cima, quando se começam a folhear as páginas? Nada.

"Trapaceiro! Ignorante! Tu é que não compreendes o que o autor quer dizer!"

Por uma vez concordamos. Eu sou de facto uma pessoa com inclinação para fazer batota, não sei assim tanta coisa quanto isso, e não compreendo PEVAS daquilo que este autor me quer dizer. A única coisa que retiro dos seus livros, para além das ocasionais citações interessantes, é que estou perante mais um autor que se está a borrifar para os leitores. Ou melhor, que está a cultivar um grupo de leitores muito específico, um grupo intelectual de intelectualidades muito intelectuais, que só são capazes de ler obras que avancem a espécie humana e que estejam rotuladas como OBRAS-PRIMAS, CLÁSSICOS e NOBEL.

É pena. Lá está, acho que o Gonçalo M. Tavares é um dos melhores escritores da actualidade. Mas mantenho-me firme na minha opinião de que é um dos nossos piores autores.

Já se tenho maturidade ou não para para dizer estas coisas, como o Sr. Burro da Silva tão bem questionou ali em cima, a única coisa que vos digo é: se tudo correr bem nunca ninguém vai achar que eu tenho propriamente maturidade suficiente para o que quer que seja. Gosto demasiado de brincar com Legos.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Mensagem, ou a longa e chateada opinião sobre um livro que, coitado, não tem culpa nenhuma


Autor: Fernando Pessoa


Opinião: Aconteceu um milagre! A sério! Para quem me conhece isto vai ser chocante, eu sei, mas espero que aguentem. Para quem não me conhece, eu explico, em termos simples e simplistas: eu odeio tudo o que o Pessoa (e derivados) escreveu. Mas desta vez, nesta releitura em específico apercebi-me de algo diferente, finalmente caí em mim e dei conta que... Estava a brincar. Odiei na mesma.

Qual é o problema disto? É que há uma lei algures num tomo obscuro num canto obscuro duma biblioteca obscura, que proíbe um português de não gostar de Pessoa. Oh, não me venham com tretas, eu sei do que falo. Entre as pessoas com quem me dou, assim de repente, só conheço uma que leia tanto como eu, e de forma ainda mais diversificada. E é difícil apanharem-me em falso numa conversa sobre livros e literatura, que eu tenho sempre muito a dizer.

Ou seja, sou um tipo informado e que percebe do assunto, quer a minha professora de História do nono ano queira ou não (velhas quezílias). E no entanto sabem o que é que acontece se eu disser que não gosto de Pessoa?

"Ainda vais a tempo!", "Não sabes o que é Literatura.", "É porque não percebes, só pode.", "Olha aqui esta parte, isto não é lindo? Como é que podes não gostar?", "Quando cresceres vais perceber.".

E a lista continua. Eu raramente respondo de forma (muito) agressiva, mas sabem o que é que me passa pela cabeça?


Sim, sem tirar nem pôr. Pelo simples facto de que, por muito arrogante que eu seja, ninguém pode negar que eu percebo de Literatura, mesmo que assumam que todo o conhecimento que eu tenho do assunto passou para a minha cabeça por osmose, de tanto queimar as pestanas. Ainda por cima quando eu sou o primeiro a realçar, e a admirar, o génio de Fernando Pessoa. O homem era, de facto, brilhante, e tinha uma mente como se fazem poucas. E não é preciso ser muito esperto para perceber que o homem tinha talento - desafio-vos a tentarem escreverem textos como se fossem três pessoas diferentes, mas ao ponto de que uma pessoa que leia consiga distinguir claramente uma personalidade distinta para cada uma dessas personagens, que têm os seus estilos e peculiaridades muito próprias.

Pessoa fez disso às dezenas. É impossível consegui-lo sem se ser um génio, um esquizofrénico ou, e esta é a minha versão favorita, um bocadinho dos dois.

Portanto eu, como toda a gente com dois dedos de testa, sou da opinião de que o homem era um génio e que merece de facto ser mencionado como uma das maiores personalidades portuguesas de sempre. Apenas não gosto das coisas que ele escreveu.

Desculpem, mas eu sou um tipo chateado que anda particularmente chateado. Este longo preâmbulo serve para mostrar que quando eu digo que a Mensagem é uma leitura de casa de banho, não o estou a dizer só porque sim. Digo-o de forma provocativa, mas sei bem o que estou a dizer. A releitura não me convenceu.

Eu até consigo encontrar pedaços que aprecio. Enquanto citações. A sério, o livro está cheio de marcadores autocolantes de um laranja brilhante a apontarem para sítios à espera de serem transcritos. Mas como um todo, sabem o que isto é? Uma resposta melancólica a Os Lusíadas, e pouco mais.

"Sim, Luís, tens razão, nós já fomos os maiores. E sim, Luís, tens toda a razão, agora somos uns nhonhas. Mas sabes que mais? Ainda vamos ser os maiores outra vez, olha aqui o potencial, olha, olha aqui, oh para este povo cheio de potencial, até já nos deixámos de confiar em reuniões departamentais dos deuses, e criámos os nossos próprios mitos! Somos DIVINOS, olha para nós, estamos tristes por já não sermos o que fomos, mas potencial! NÓS SUAMOS POTENCIAL PELOS NOSSOS POROS, LUÍS!!"

Enfim. O livro está escrito com a mesma simplicidade técnica da poesia do ortónimo. Não, não é a simplicidade de quem recusa a máquina da complexidade estilística e quer quebrar barreiras; é a simplicidade de quem estava tão perfeitamente convencido da sua genialidade que sabia que podia não ter demasiado trabalho.

O tipo era óptimo a encadear palavras para que as frases soassem bonitas, mas era péssimo a encadear frases para que as ideias soassem a alguma coisa palpável. É por isso que a sua prosa era entediante, no mínimo, e é por isso que se dava melhor com a poesia, o formato literário em que a forma se sobrepõe ao conteúdo.

A lengalenga que nos vendem na escola é que isto é a melhor coisa de sempre. Só que não. E quem contraria é crucificado ("booo, boooo, estás a exagerar"... pois estou). Infelizmente este autor, e a grandiosidade da sua excelsa obra, já estão instalados e fazem parte da mobília. E é pena. Porque há muito bom autor, entre romances, contos, teatros e poesia (se eu tivesse paciência para procurar estes últimos), que merecia ser estudado. E em vez disso, paletes de Fernando Pessoa a serem-nos enfiadas pelas sinapses adentro! Nem digo para o eliminarem do programa, mas caramba, variem um bocado a coisa e...


Fiquemos por aqui.

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Os Lusíadas


Autor: Luís de Camões
Tradutor: não tem, mas quase que precisei!


Opinião: É a terceira vez que leio este livro. Eu sei que sou louco, não se preocupem. Mas além de gostar genuinamente da obra, que é um dos pináculos máximos da nossa Literatura, não é difícil de descobrir novos significados e novos pormenores com cada leitura. Especialmente quando se parte para essa mesma leitura com perspectivas diferentes.

Reparem: da primeira vez que li isto estava no décimo segundo ano, e quis ter uma noção da obra como um todo para a analisar melhor em aula; da segunda vez foi por causa de uma iniciativa aqui no blog, a Temporada Épica, durante a qual me propus a ler uma série de epopeias; esta terceira vez também foi inserida numa temporada temática, mas desta vez a massiva Lusofonices, e num contexto de outras obras que têm ligações com este épico (A Mensagem, de Fernando Pessoa e Uma Viagem à Índia, de Gonçalo M. Tavares).

Sou um tipo que gosta de se divertir.

No entanto não vale a pena fazer de conta que adorei a leitura. É que desta vez decidi fazê-la numa edição fac-símile da primeira edição, em 1572 (!), o que significa que tive que sobreviver ao português de há quinhentos anos. Não foi uma tarefa nada fácil. Desenganem-se. Custou bem mais do que aquilo que eu estava à espera.

Nem sequer consegui acompanhar a narrativa de forma decente. Também estava mais interessado em apanhar as simbologias e os significados, e a partir de certa altura fiquei fascinado com as diferenças para o português actual (usavam a letra beta, com os alemães, em vez de 'ss'!), mas a verdade é esta: a escrita afastou-me do conteúdo e fez-me focar na forma.

O que, só por si, não é propriamente mau. Afinal, estou a falar de um dos livros mais tecnicamente perfeitos da história da Humanidade. E já conheço a(s) história(s) bem o suficiente, graças às minhas leituras anteriores e ao estudo semi-forçado de há quatro ou cinco anos.

Querem saber o que é que encontrei? Além da já mencionada mestria em manipular a língua portuguesa, encontrei uma camada muito subtil de alguma coisa debaixo de toda a crítica, sátira e de todo o nacionalismo. Não é algo que seja facilmente identificável, mas pareceu-me ter um tom auto-acusatório direccionado ao povo português.

Não, não é o Velho do Restelo, um símbolo para a mentalidade retrógrada e simplista que ainda domina a opinião pública nos dias de hoje, nem é a comparação do povo português real com Vasco da Gama e sua armada, símbolos do grandioso povo português. É algo mais do que isso. É quase vergonha, e uma visão racional e surpreendentemente actual das coisas, como se Camões dissesse, por exemplo, "sim, há deuses a conspirar contra nós, mas também há deuses a conspirar a nosso favor".

Os Lusíadas, para mim, nesta terceira leitura, pareceu-me um longo discurso contra a passividade que nos tem sido tão natural enquanto povo (a minha ex-co-autora aqui no blog, a Alice, vai adorar isto). A narrativa não é só efabulada, é altamente exagerada e enaltece os nossos actos durante os Descobrimentos de forma descabida. Parece um nacionalismo do mais exacerbado possível, mas não é esse o tom. Não são dez cantos a dizer "VASCO DA GAMA RULZ", nem nada que se pareça.

É antes a história do que acontece se condensarmos o povo português num homem e respectiva armada. Faz-se a pergunta, em termos simples, "e se nos deixássemos de coisas e trabalhássemos com um objectivo comum?", e responde-se, em termos complicados mas com tradução simples, "levávamos tudo à frente!". E no entanto não o fazemos agora, nem o fazíamos na altura, aparentemente.

Até podíamos ser considerados um dos maiores e mais poderosos povos de todo o Mundo, mas o nosso Império está no dicionário à frente da expressão "em cima do joelho". Desta perspectiva, a Ilha dos Amores, mesmo perto do fim do livro, não é uma recompensa, é uma distracção. Depois de tudo o que construímos, distraímo-nos, e panhonhas como somos, acabamos o livro com um tom novamente repreensivo.

Talvez não seja a leitura mais óbvia, mas foi a ideia com que fiquei desta vez. Nem sequer é muito fácil de explicar, eu sei. Mas pensem nisso.

sábado, 14 de novembro de 2015

Sr. Burro da Silva, o leitor hipotético


Lembram-se deste texto, sobre suspensão da crença? Foi lá que nasceu o Sr. Burro da Silva, um ser imaginário que fez sucesso entre quem acompanha o blog. Na altura não pensei muito nisso, mas a pedido de uma imensa quantidade de famílias (duas pessoas) decidi que não era má ideia fazer deste meu amigo abstracto um membro regular dos meus textos.

Mas quem é, afinal, o Sr. Burro da Silva? Qual o motivo do seu nascimento? Porque é que se chama assim? E qual vai ser o papel daqui para a frente?

Para começar, o Sr. Burro da Silva é uma criatura conceptual que condensa na sua não-existência todas as características possíveis e imaginárias que me irritam noutras pessoas. Especialmente no que diz respeito a escrita e leitura.

É que, digamos, como alguém que sempre teve opiniões fortes, e que não tem vergonha de ler e escrever o que muito bem lhe apetece, pessoas a gozarem comigo por causa disso é o pão nosso de cada dia, há anos. Às vezes nem é gozar, é mesmo menosprezar.

Este Sr. Burro da Silva é um leitor hipotético que simboliza, de uma forma geral (mas também particular), pessoas que me irritam. O que quer dizer que se significados simbólicos se medissem numa qualquer unidade de massa, o Sr. Burro da Silva seria um indivíduo imaginário deveras gordo.

Felizmente este meu amigo mora num espaço abstracto e meramente conceptual, com o objectivo de ser puxado da cartola sempre que precisar de dialogar com alguém para explicar melhor alguma coisa a quem lê estes textos que teimo em publicar por aqui.

"Sirvo para quê, repete lá?"

Ora se não é o próprio Sr. Burro da Silva! Bons olhos mentais o vejam, ainda bem que voltou do seu retiro intelectual chamado Fantasia não é Literatura: se eu quisesse ler coisas irrealistas ia ler os acordos do PS com o BE, o PCP e o PEV.

Sim, ele é agressivamente de direita, em termos políticos. Nem sequer um PSDzito, é mesmo CDS-Paulo-Portas-é-um-deus-irrevogável. Mas deixemos a política fora destas coisas! Como vai, Sr. Burro da Silva?

"Estou confuso."

Não me surpreende. A única coisa que consegue estar mais vezes do que surpreendido é perplexo, e acho que é só porque pensa que querem dizer a mesma coisa. Mas não se preocupe que eu explico rapidamente: agora trabalha para mim!

"Ai sim? Por alma de quem, seu rabilas que lê Stephen King e gosta de Dan Brown?"

Tenha calma, que ambos esses autores tendem para fast food, mas Stephen King é mais uma espécie de hamburgueria gourmet, enquanto que Dan Brown é um McDonalds daqueles gordurosos e mal encarados. Não interessa. Fico mais curioso com o facto de não gostar de Dan Brown...

"Aquilo não é literatura a sério."

Bem, até concordo. É repetitivo, como o Nicholas Sparks, e o tipo estica-se demasiado a escrever. Mas, e não me orgulho muito desse facto, mas também não me envergonho particularmente, até gosto bastante de um livro dele, Fortaleza Digital, ou pelo menos lembro-me de gostar, que já o li há uns anos largos.

"Bah. Ainda por cima a compará-lo com o génio literário que é o Nicholas Sparks."

Como?

"Nicholas Sparks! Um dos maiores escritores vivos, com histórias tocantes, bem escritas, originais!"

Que... Ah, calma. Já sei. Também não gosto de pessoas que não são coerentes. Isto vai ser divertido. Sr. Burro da Silva?

"O que foi?"

Pode regressar para a sua casa conceptual e ler... bem, o que andar a ler agora.

"Estou a fazer uma maratona pelas notas de rodapé e os anexos dos livros do David Soares! Aquilo sim, vale a pena."

Está bem, então. Adeus, até à próxima.

Como podem ver, o Sr. Burro da Silva é uma óptima desculpa para eu gozar com as coisas e fazer de conta que tenho piada. Não sei quando é que ele volta, mas há-de voltar de certeza absoluta. Por agora não percam o próximo episódio, porque nós... também não!

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

O Diabo e Eu


Autor: Alcimar Frazão


Opinião: Sabem o que se faz quando se encontra um livro excelente? Aquela vontade de pular e de reler e de folhear e de contar a toda a gente o quão espectacular é o livro, e tudo isso? Sabem o que é que eu fiz quando acabei este livro?

Nenhuma dessas coisas.

Tinha alguma esperança, pois a arte é muito boa, e a história é uma daquelas que faz parte da nossa mitologia moderna: um acordo faustiano entre o Diabo e um músico, para que este último tenha talento e sucesso para dar e vender.

Todas as dicas, do título ao prefácio, indicam que é exactamente essa a história que vai ser contada. Mas nem por isso. Em vez disso acompanhamos o protagonista durante a sua infeliz, em que vê a sua mãe ser forçada a prostituir-se, ganha um alcoólico abusador como padrasto, e é miserável de uma forma geral.

Não que não seja uma história interessada e carregada com os seus próprios simbolismos: também há uma espécie de acordo feito com uma espécie de Diabo. Mas este livro é basicamente um pecado capital das personagens interessantes: uma história de origem desnecessária.

Da mesma forma que explicar de onde vem o Joker, e o porquê de ele ser como é, lhe tira força enquanto vilão e enquanto personagem, por nos tentarem fazer sentir empatia por uma personagem que é suposto deixar-nos perturbados, também esta história de origem nos vai obrigar a ver o protagonista sobre outro ponto de vista completamente diferente. O que não é bom, neste caso.

Safa-se a arte, que é realmente impecável, e é uma pena que o autor tenha escolhido uma via tão banal, com uma arte tão excepcional e um argumento com algum potencial.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Living Will #2


Argumento: André Oliveira
Arte: Joana Afonso


Opinião: Estou rendido. Ganharam, André Oliveira e Joana Afonso. A arte continua impecável, o jogo de cores é fantástico, e desta vez até a história brilhou.

Aquilo que podia ser apenas mais uma história banal de alguém a resolver erros do passado torna-se exactamente isso, só que interessante. O ritmo emocional está muito bem conjugado com o que se vai mostrando, e acaba por ser uma história com um pequeno final feliz, no meio de uma série de histórias tristes.

Gostei que o foco tenha sido mais ou menos dividido entre Will, o idoso que conhecemos no volume anterior, e Betty, uma nova personagem que parece ter mais ou menos as mesmas motivações de Will. Não se conhecem, não interagem, e as suas histórias não se cruzam, mas não deixa de ser uma forma de marcar a história como uma exploração da idade, da memória e da solidão.

O desenvolvimento da história acontece da melhor maneira, e até parece meio inesperado e sem contexto suficiente, mas tudo encaixa perto do final. Se isto não é sinal de uma história bem contada, não sei o que poderá ser. Ainda para mais com a vantagem de ter a arte de Joana Afonso, que se está a revelar uma tremenda mais valia nesta história, ao contar tanto, ou mais, do que aquilo que os diálogos e a narração conseguem sequer fazer imaginar.

A fasquia agora fica bem alta, portanto espero bem que a qualidade se mantenha. Só que não estou muito preocupado, porque muito sinceramente, estou confiante que isto só pode, e só vai, melhorar.

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Scott Pilgrim Agora é a Sério (Scott Pilgrim #4)


Autor: Brian Lee O'Malley
Tradutor: Renato Carreira


Opinião: Tan tan tan! A Ramona é bissexual. Ou teve uma fase lésbica. O que preferirem. Então o namorado maléfico que Scott tem de derrotar é uma rapariga. E ele não consegue lutar com raparigas. Então tem que ser a Ramona a andar à porrada, o que até é uma evolução positiva.

No entanto este livro vem anunciado como o melhor da colecção, o que não acredito muito. É porreiro, sim, e até agora é aquele que tem mais desenvolvimento, tanto da história como das personagens, mas deixa algo a desejar.

O surrealismo, que até agora era apenas hilariante e estranhamente ao estilo do humor britânico, passa a aproximar-se da ligeira parvoíce, e isso não é bom. A relação entre o Scott e a Ramona é estranha e fica mais estranha. Mas foi uma boa leitura, e agora tudo depende dos últimos dois livros, a conclusão desta saga!

sábado, 7 de novembro de 2015

Amadora BD 2015


Depois de anos a adiar, lá passei pelo Amadora BD, este ano. Diverti-me e até comprei uns livritos, mas querem saber qual é a minha opinião geral?

Meh.

O espaço das vendas está porreiro, e tem os culpados do costume, da Kingpin à GFloy, com a Chili com Carne, a Polvo, a Levoir, mais algumas (não me lembro de todas) e o próprio império do mal, a Leya.

Uma pedaço agradável a que só faltaram uns descontos para agradar à malta, mas não tenho queixas e até trouxe algumas coisas. A Polvo tem coisas muito interessantes, e a Kingpin é a espectacularidade do costume (embora se tenha excedido, da melhor maneira, com os mais recentes lançamentos, com edições de luxo!), e a GFloy apresenta-se claramente como uma potência a ter em conta. A Leya continua a ser maléfica, a Levoir torna-se menos interessante por não ter muita diversidade, e a Chili com Carne continua a soar demasiado estranha para mim.

Mas depois o espaço das exposições (e o minúsculo auditório com entradas à frente e não atrás) deixa muito a desejar. Esperava muito mais, pelo menos. Ainda por cima tive que gramar a minha namorada a queixar-se de como tinham esburacado os livros todos para estarem ali presos a serem exibidos. Acho que uns alarmezinhos e umas torres à entrada como nas lojas faziam o serviço de forma mais agradável.

O problema mais grave das exposições, no entanto, é a brutal falta de informação. Meus caros, simplesmente expor painéis de BD dentro de molduras demasiado grandes ao longo de toda a parede não me vai dizer muito. Gostava de ter alguma informação, algum contexto, enfim...

Portanto não foi um mau bocado, o que ali passei, mas digamos que não foi propriamente extraordinário. Quando podia, muito perfeitamente ter sido. Já para não falar de que ninguém me tira da cabeça que a visibilidade do evento sofre de uma deficiência qualquer, uma vez que este é muito, mas muito mal publicitado...

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Em Busca de Peter Pan


Autor: Cosey
Tradutor: Pedro Cleto


Opinião: A arte deste livro convenceu-me logo na capa. Volta e meia ainda aparecia uma página com este estilo, grandiosa, com vastas paisagens cheias de neve. O detalhe é apenas o suficiente para passar uma ideia do tamanho e da beleza daquilo que nos está a ser mostrado.

O que Cosey faz depois, sinceramente, nem me interessa muito. É uma história relativamente banal de um escritor inglês, um dandy ligeiro que se refugia nas montanhas para tentar ultrapassar o seu bloqueio de escritor. Tem uma história de vida com pormenores trágicos, mas é uma pessoa normal.

Faz várias amizades com gente peculiar (e um porquito) e até arranja uma paixoneta. Mas pouco mais.

A outra coisa que vale a pena ver é como Cosey consegue incluir tantas personagens que estão à procura de alguma coisa, como se isso fosse um objectivo por si só. Origina bons momentos de reflexão!

E até a história me consegue cativar, a certa altura, ao ter um final completamente inesperado e surpreendentemente brutal. Fiquei em choque com o que acontece, ainda por cima por ser algo que adiciona carga emotiva à história e a torna muito mais do que uma simples história sobre um dandy!

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Scott Pilgrim e a Tristeza Infinita (Scott Pilgrim #3)


Autor: Brian Lee O'Malley
Tradutor: Renato Carreira


Opinião: Scott continua a ser um ignóbil que não compreendo que seja o protagonista. Mas suponho que as suas fraquezas apenas lhe dêem uma camada de realismo, enquanto personagem.

Por outro lado, o 3º ex-namorado maléfico da Ramona é Todd, baixista na mesma banda em que a ex-namorada de Scott, Envy, é vocalista. E é vegan. O que quer dizer que tem super poderes psíquicos. Que lhe são retirados pela polícia vegan depois de ele comer um gelato, que tem leite e ovos.

Há que adorar isto. No entanto é mais um combate que o Scott ganha por ser um tipo sortudo e mais nada. Mas nota-se a qualidade a aumentar, com as histórias cada vez mais reais e cada vez mais fortes, e desenvolvimento real das personagens!

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Death Parade


Esta anime foi-me muito bem recomendada. E após o primeiro episódio, não fiquei inteiramente convencido. Mas pareceu-me bem feito. Todo o mistério por detrás da coisa, a situação impossível em que as personagens se encontram, a conclusão do episódio... Competente, no mínimo.

Em termos simples, o que a série acompanha é a rotina em Quindecim, o bar onde chegam as almas de pessoas que morrem ao mesmo tempo, e onde vão ter que jogar uma contra a outra, para decidir quem é que vai para o Céu (reencarnação) e quem é que vai para o Inferno (esquecimento). Ao início perdem praticamente todas as suas memórias, em especial a de que morreram, e só as vão ganhando lentamente.

Mas logo ao segundo episódio a série revela-se muito inteligente, ao apresentar, uma autêntica desconstrução do primeiro episódio! Golpe de génio. Se o episódio anterior foi contido e bastante directo, este apresenta mais personagens, dá pistas de um universo complexo, origina bastantes mistérios e permite uma segunda perspectiva dos acontecimentos anteriores. A nova personagem, Nona, é fantasticamente malévola, de certa forma, e a rapariga sem nome é misteriosa, mas o episódio não quer saber disso. O objectivo é mostrar que aquilo que as conclusões que tirámos do caso do episódio anterior estão erradas, e que Decim se enganou. Muito esperto, e muito bem feito, impecável!

Os episódios decorrem de forma aparentemente banal, embora nunca se repitam. É preciso dar pontos a Death Parade por ter uma estrutura tão obviamente formulaica, e conseguir não se tornar numa sequência irritante e desinteressante de episódios todos iguais uns aos outros.

Além de que cada episódio é mais intenso do que o anterior. A emoção está muito bem trabalhada, e de forma muito óbvia (mas não aborrecida) quando Decim, o bartender aparentemente sem emoções, revela um gingarelho que permite interferir com os jogos, que já são brutais por si só, para conseguir extrair a parte mais negra de cada pessoa. O dilema moral que se cria é fascinante, e nunca é verdadeiramente respondido: essa faceta mais negra já lá estava, ou é criada pelas situações em que Decim põe as pessoas?

Há também o facto de que a lenta, mas eficaz, introdução de novas personagens recorrentes e de detalhes sobre o mundo em que se movimentam está muito bem feita, e é impossível não ficar interessado numa ou noutra coisa.

As personagens também se revelam cada vez mais complexas do que pareciam à primeira vista, e embora não haja propriamente uma história no sentido comum da palavra, há uma série de ligações e de dicas que vão sendo dadas que ficam meio no ar e precisam de ser respondidas - o que me deixa sempre agarrado à espera de saber mais!

Os mistérios adensam-se em redor de todas as personagens, e ao fim dos primeiros sete episódios percebe-se que foram quase uma introdução longa que já incluiu algum desenvolvimento. Tudo indica que a partir daí, e nos cinco episódios que restantes, é que tudo vai acontecer, e provavelmente a um ritmo estupidamente alucinante.

É então que em vez de uma simples história, fazem um two-parter, com as personagens mais dramáticas e bem construídas da série até agora. A conclusão da história é fascinante, e agradou-me bastante, com Decim a tentar quebrá-los ao máximo. Tudo se torna mais impressionante quando Decim fica apático, com um surge de emoções que claramente não compreende e que não deita cá para fora, e o episódio acaba sem revelar qual dos dois julgados vai para onde, mas apenas com a imagem da cara demoníaca por cima do elevador do Inferno, e mais nada. Brilhante!

Começam a surgir as dúvidas e as dicas que foram sendo dadas ao longo dos episódios juntam-se e encaixam de forma perfeita. Nona, a chefe de Decim e subordinada de Oculus, um velhote que afirma ser o mais parecido que ali existe com Deus, tem claramente um qualquer plano desde o início, que só é revelado no final e aponta directamente ao foco emocional da série: a ausência não tão completa quanto isso de emoções de Decim.

O final, sem ser perfeito, desapontou-me, mas foi algo que fez sentido em termos narrativos. A série no geral agradou-me, e ficou definitivamente marcada como uma das melhores que já vi. Original, corajosa, intensa, com histórias bem contadas e personagens perfeitamente caracterizadas. Os temas abordados são explorados até à exaustão de formas normalmente pouco óbvias e não cansativas nem intrusivas durante os episódios. Há momentos menos bons, mas também há momentos absolutamente brilhantes, especialmente quando se trata de explorar o lado negro da Humanidade de cada um.