quarta-feira, 30 de abril de 2014

Os Vingadores #3


Argumento: Jonathan Hickman
Desenhos: Steve Epting
Tradução: José H. de Freitas

Opinião: Fiquei bastante curioso ao ver esta capa. O Black Panther desperta-me a curiosidade desde sempre, o Iron Man nunca falha, o Doctor Strange é outro que me fascina, o Reed Richards é engraçado, vá, e o Raio Negro é uma boa personagem. Porque raio estariam a aparecer associados, e no seguimento das histórias anteriores?

Pois bem, uma das coisas explicou-se logo: não é bem no seguimento das histórias anteriores, e não sei se gosto muito dessa opção. Ou melhor, tenho sentimentos conflituosos. Se por um lado acho que é bom juntarem numa única revista a história relevante, que é tão normal perder-se nas entrelinhas e em títulos laterais ao "principal", por outro acho que é enganar o público.

Mas confesso que vou perdoar e inclinar-me mais para a primeira opção, porque acho que até fizeram bem a coisa. É um desvio à narração principal que faz sentido e que explica algumas coisas, conseguindo sempre ser interessante. É claro que ter um conjunto de personagens muito boas e fascinantes (juntem o Namor e o Capitão América àquela lista lá em cima) é um bónus que permite alicerçar a história no carisma colectivo, mas mesmo assim, acho que foi um bom trabalho.

Já os detalhes... Enfim, passo a explicar: estas personagens, juntamente com o falecido Charles Xavier, formam os Illuminati, um grupo secreto de super-heróis que de alguma forma coordenada os outros e age nos bastidores dos acontecimentos, garantido que tudo corre bem.

Não sei se já perceberam, mas isto é um grupo de elite com elementos de elite em relação aos seus próprios grupos de elite. E se percebo a inclusão de personagens extremamente poderosas como Doctor Strange, Raio Negro e Charles Xavier, assim como de crânios, como o Iron Man, o Black Panther e Reed Richards, a inclusão de Namor e do Capitão América deixa-me um pouco confuso.

Mas talvez isso tenha a ver com o facto de terem as Infinity Gems, um conceito que felizmente é conhecido o suficiente para eu não me ter perdido. Porque isto é um problema, este reset mal amanhado da Marvel, em que não há realmente nada novo, apenas se mata muita gente, ressuscitam-se algumas, arranjam-se desculpas para se ignorarem outras tantas, muda-se a numeração e pronto. Há uma continuidade muito forte que acaba perdida.

De qualquer forma fiquei agradado com este número. Tive pena de não se dar mais tempo de antena ao Doctor Strange, uma personagem que me tem fascinado bastante e da qual ainda sei e li pouco. Por outro lado a história é bastante focada, diria quase centrada, no Black Panther, uma personagem que me interessava mas que não conhecia muito bem, e que me surpreendeu pela positiva e de que maneira!

Inteligente, com poderes marados, fortes morais e uma personalidade grave de quem está habituado a carregar responsabilidades aos ombros, Black Panther além de herói, é um rei. Mas não é um rei distante, como Raio Negro, ou arrogante, como Namor, é um rei que só se distingue dos seus súbditos pela forma como se veste e pelas suas acções. Verdadeiramente fascinante e uma personagem que fiquei com vontade de explorar.

A história propriamente dita não é nada de especial, e consegue dar tempo de antena à inutilidade do Capitão América, que consegue, em cerca de vinte segundos, inutilizar a arma mais poderosa de todos os Universos. Juro que não sei como é que ainda o deixam usar o escudo.

Por agora é esperar pelo próximo comic, que pelo que percebi ainda vai seguir este grupo super-hiper-mega-ri-secreto. Eu estou curioso, e se não inventarem muito ainda conseguem melhorar isto.

segunda-feira, 28 de abril de 2014

Que as citações nos caiam em cima [49]


'[...] You know what's waiting?'

'I'll know soon enough,' said Barrow. 'I'll just enjoy life while I can.'

Cabal leaned forward. 'I know now,' he said, caution gone. 'One place is run by a bored, disappointed sadist. The other... Spiritual transfiguration, do you know what that means? It means having everything that you ever were stripped away, bars of light, too intense to look upon.' He unconsciously fingered the smoked glasses in his breast pocket. 'Homogeneity incarnate. Can you imagine that? That's what the Heavenly Host is, countless thousands of bars of light, souls burning, all the same. Your personality lost forever. Immortal souls, hah! It's the final death. Sacrificed to a mania for order.' He looked around at the middle distance, his disgust a palpable thing. 'Lambs to the slaughter.'

Barrow put his cup down. 'Why do you hate death so much?'

Cabal seemed to rein himself in. 'I don't hate death. It's not a person. There's no grim skeletal figure with a scythe. I try to avoid hating abstracts, it's a waste of effort.'


The Necromancer (Johannes Cabal #1)
Jonathan L. Howard

The Necromancer (Johannes Cabal #1)


Autor: Jonathan L. Howard


Opinião: Divertido até ao tutano. Acho que a minha opinião fica por aqui. A sério, podia perfeitamente não dizer mais nada. Aquela frase inicial já vos diz tudo o que precisam de saber: ler este livro é embarcar numa longa viagem de figuras tristes (quando desatarem a rir sozinhos em público), dores musculares (de tanto rir), e vista turva (de lerem durante tanto tempo seguido).

Sim, este livro é viciante, engraçadíssimo e muito bem escrito. É o primeiro romance de Jonathan L. Howard, que antes se dedicava a criar jogos de computador, mas não parece. O humor tipicamente britânico está muito presente, aqui permeado pelo macabro, com uma boa escrita, uma história interessante e personagens fantásticas, com destaque para Johannes Cabal, o necromancer do título, e o seu irmão Horst Cabal que, bem... é peculiar.

Juntos, têm que reunir cem almas no espaço de um ano, para que Johannes vença uma aposta feita com o próprio Diabo e possa recuperar a sua alma, que tinha trocado pelo conhecimento negro que possui e que agora lhe faz falta, já que o seu estado sem alma interfere com as suas experiências.

E qual a forma perfeita de fazerem isto? Com uma feira ambulante! O diabo tem uma série delas armazenadas, todas perfeitamente diabólicas, como é óbvio, e empresta uma aos irmãos Cabal. O resultado é uma série de situações engraçadas, negras e ocasionalmente bastante dramáticas, numa trama que consegue balançar momentos emotivos com momentos de chorar a rir no espaço de apenas algumas páginas.

Mas a grande vitória do autor são as personagens, como já disse. Johannes é carismático, engraçado, frio e bastante complexo. Há ali claramente um objectivo escondido desde o início e que é perfeitamente perceptível a meio do livro, embora só seja oficialmente revelado no fim, com essa revelação a proporcionar um final fraco para um livro fantástico. Cabal é um homem racional e implacável, que não olha a meios para atingir os seus fins, e de cada vez que abre a boca está muito provavelmente a gozar com alguém ou alguma coisa.

Já o seu irmão, Horst, embora também seja bastante gozão, e uma personagem com características peculiares por si só, é mais ligado às emoções e tem princípios morais mais fortes e bem definidos, razão dos constantes confrontos com o irmão.

E isto tudo sem falar das inúmeras personagens secundárias, como Mr. Bones e o próprio diabo, todas elas a proporcionarem momentos que além de hilariantes, avançam com a história de alguma forma. Isso é uma das grandes proezas do autor, o conseguir contar piadas E uma história.

Como já disse, só o fim é que me desapontou, porque de resto este é um livro excepcional, com o melhor que o humor britânico tem para oferecer misturado com uma boa dose de fantasia macabra. Só não é aconselhado a quem não apreciar humor negro...


'Have you any interest in psychology?' asked Horst.
'Certainly not,' replied Cabal. 'I'm a scientist.'

sábado, 26 de abril de 2014

Sobre ser-se publicado

Há um problema no mundo literário. Um problema que se tem vindo a agravar a uma velocidade impressionante e com consequências terríveis.

Não, não estou a falar de nada relacionado com a Margarida Rebelo Pinto. Eu sei que parece mas, por muito que me custe a admitir, isto é pior.

Falo de ser-se publicado. Actualmente é tão fácil ter um livro feito de forma "profissional", por "editoras" a sério, que parece que toda a gente que escreve acha que publicar um livro é um direito seu, sejam a sua escrita e as obras que escreve muito boas ou muito más.

Aliás, isso não interessa. É preciso é ter qualquer coisa escrita. E uma das grandes causas deste problema são as vanity presses, entidades abjectas e desagradáveis que cobram ao autor para lhe publicar o livro. Ou para participarem numa antologia.

O escritor David Soares expõe muito bem o assunto num mini-manifesto em que aponta tudo o que estas entidades têm de mau. Maléfico, até!

E a pior parte ainda é a mudança de mentalidade a que isto leva. Seja numa "editora" ou num site manhoso, por mais ou menos euros, qualquer pessoa pode ser "publicada" de forma oficial. É assim que acontecem acidentes, caríssimos. Quando toda a gente achar que é o Gordon Ramsay ou o Jamie Oliver, passo a comer só enlatados. Se toda a gente achar que sabe escrever bem o suficiente para ter um livro publicado... Bem, tenho pena das gerações futuras.

O que acontece depois é o seguinte: desespero e humilhação levam os autores a aceitar condições miseráveis em troca de se verem publicados. Como por exemplo serem publicados exclusivamente num formato de que ninguém quer saber e dá problemas com facilidade, inseridos num projecto condenado ao fracasso.

Coolboks é só o mais recente ceguinho em quem toda a gente está a gostar de bater, como podem ver no blog da Alexandra Rolo, num post a apontar os defeitos desta nova iniciativa. Alguns, porque há mais.

Não quero com este seguimento fazer qualquer juízo de valor relativamente aos livros publicados dentro desta nova chancela, até porque tenho confiança que o da Carla Ribeiro seja bom, tendo em conta o que já li dela. Mas... Enfim.

Casos como estes há muitos, e a minha abordagem usual de ignorar até me esquecer que existem e não me aborrecer muito a pensar nisso já começa a falhar, provavelmente por causa do elevado número de situações. Só queria que as pessoas tivessem noção do que andam a fazer, e a escrever, e não se submetessem a estas coisas. Como diz o David Soares: leitores, não comprem; autores, não se metam nisto.

sexta-feira, 25 de abril de 2014

X-Men #3


Argumento: Brian Michael Bendis
Arte: Stuart Immonen e David Marquez
Tradutor: Filipe Faria

Opinião: Por mais fascinantes que eu os ache, é melhor que estes X-Men se desenvolvam rapidamente, porque isto corre o risco de se tornar fraco.

Neste comic já há um pouco da acção acelerada, divertida e inconsequente que caracterizam as típicas histórias de super-heróis, bem como o humor a piscar o olho aos filmes, mas não me convenceu.

O argumento até está bem construído, a forma como o Scott do passado lida com o facto de estar no futuro e a forma como o Scott do presente não lida com o facto de ver uma versão sua vinda do passado, por exemplo. Ou o fascínio do Anjo pelo seu eu mais novo e o mistério que este último não consegue deixar de sentir no seu eu mais velho.

É terreno perigoso, concedo. Viagens no tempo são muito complicadas de trabalhar, entre paradoxos e situações estranhas e imprevisíveis, mas uma coisa é certa: pode-se tornar muito interessante com uma velocidade impressionante.

Infelizmente Bendis apenas aborda esses assuntos muito ao de leve, preferindo "perder" mais tempo a desenvolver as personagens e a fazê-las interagir umas com as outras, o que não é mau, antes pelo contrário. Só se torna desagradável quando em tão pouco tempo narrativo se revisitam as mesmas personagens com exactamente os mesmos dilemas.

Ainda por cima dilemas juvenis. Por muito que eu gostasse de intrigas amorosas e afins, há um limite para a quantidade de vezes que eu conseguiria ouvir falar disso sem ter vontade de furar os tímpanos. E o argumentista decide ignorar isso e focar-se principalmente em três personagens que são as que acho menos interessantes: o Ciclope, a Jean Grey e o Anjo, os três vindo do passado e cada um a lidar de forma diferente com o que se está a passar.

Ciclope parece negar, um pouco como a sua versão adulta faz, mas sente um peso na consciência por algo que ainda não fez e que ainda por acima é acirrado pelos olhares recriminatórios dos outros mutantes. Já Jean Grey oscila entre o "mas o que é que eu estou aqui a fazer" e o "sou uma mulher forte e independente e vou fazer o que quer que seja preciso" com uma frequência assustadora. Mas embora não seja fã da personagem, devo dizer que fiquei impressionado e agradado com a sua faceta mais implacável nascida na adversidade, exemplificada quando convence o Anjo, completamente perdido, derrotado e humilhado, a juntar-se à sua causa, proporcionando, em 3 vinhetas, um dos momentos mais arrepiantes que já li na minha vida.

Isto tudo e ainda há tempo para os Anjos derrotarem um pelotão de assalto da Hydra, que decidiu que a Torre dos Vingadores ficava mais bonita na horizontal, mas infelizmente não há muito tempo para seguir os mais-ou-menos-vilões da história, Ciclope-adulto, Emma Frost, Magneto e companhia limitada. No entanto o aparecimento de Mystique (ou Raven, como lhe chamaram) é um elemento interessante e que pode desencadear muita desgraça, ou não estivesse esta personagem sempre ligada de alguma forma a algum tipo de caos.

Falta ver como é que tudo se desenvolve. Gostava de ver mais do Magneto porque, bem, o Magneto é fixe. E no final deste comic acontece algo com bastante bom aspecto mas que me é, de momento, completamente inexplicável. Ou seja, estou curioso, muito curioso, embora a minha confiança esta periclitante...

quarta-feira, 23 de abril de 2014

Disney Especial: Patinhas vs Patacôncio


Argumento: Giovanna Bo, Fabio Michelini, Stefano Enna, Bruno Sarda, Gaya Perini, Bruno Concina, Giorgio Pezzin, Rodolfo Cimino, Ennio Missaglia, Massimiliano Valentini
Arte: Giorgio di Vita, Sergio Cabella, Luciano Gatto, Alessandro Gottardo, Graziano Barbaro, Ottavio Panaro, Stefano Intini, Danilo Barozzi, Comicup Studio, Andrea Lucci

Opinião: Depois de eu muito bradar aos céus, as minhas preces foram ouvidas! Não sei que tipo de divindade cartoonesca controla estas coisas, mas se descobrir ergo-lhe um altar. É que já li vários especiais e Big's deste renascer destas personagens por terras lusas, e devo ter dito em todas as críticas que gostava mesmo de ver o Patinhas era em confrontos com alguém. Especialmente se esse alguém fosse rico, poderoso, teimoso e implacável como ele. Acho que traz o melhor do Patinhas ao de cima.

E é então que lançam este especial inteiramente dedicado a confrontos entre o Tio Patinhas e o seu jovem inimigo, o Patacôncio! Trezentas e vinte páginas de porrada, sangue e tripas!

Não, isso não é aqui, esqueçam essa última parte.

Falemos das histórias. Há algumas parvas e inverosímeis, mas que não deixam de ser engraçadas, e há outras tantas que são mesmo muito boas. Logo para começar em força, uma história com um fim surpreendente, que nas mãos de um desenhador com outro estilo ainda tinha ficado melhor. Spoiler alert: é tudo um jogo no computador no Patacôncio. Foi interessante e altamente inesperado, mas tinha sido muito mais satisfatório se ao longo da história tivessem aparecido pistas subtis que permitissem chegar ao fim e pensar "ah, então é por causa disso que aconteceu aquilo".

Interessante de ver, também, são as histórias em que nenhum dos dois ganha. Mais que não seja porque nessas normalmente há algum tipo de colaboração entre os dois, ou uma rivalidade ainda mais acirrada do que o normal, o que implica mais interacção entre ambos. E isso é sempre bom de se ver. A dinâmica que conseguem ter entre inimizade e companheirismo é fascinante e raramente estragada por um argumento menos bom. Personagens que vivem verdadeiramente por si só!

Há ainda alguns destaques a fazer, como a história dupla com a participação do Avô Metralha, provavelmente o melhor Metralha de todos, e uma história que em si não tem nada de extraordinário (para além da primeira cena ser o Tio Patinhas a pedir a Brigitte em casamento), mas que tem uma arte absolutamente fantástica. O desenhador é Graziano Barbaro e fiquei fã! As personagens estão mesmo muito expressivas, e os desenhos cuidados são um regalo para os olhos.

Tirando uma ou duas histórias mais fraquitas, e o uso de "ciência" em pelo menos duas das histórias, este Especial foi uma óptima leitura e só posso redobrar a minha confiança nesta colecção!

segunda-feira, 21 de abril de 2014

Que as citações nos caiam em cima [48]


"Não tendo boneca com que brincar, e a maternidade já pulsando terrível no coração das órfãs, as meninas sabidas haviam escondido da freira a morte de uma das garotas. Guardaram o cadáver num armário até a freira sair, e brincaram com a menina morta, deram-lhe banhos e comidinhas, puseram-na de castigo somente para depois poder beijá-la, consolando-a. Disso a mãe se lembrou no banheiro, e abaixo mãos pensas, cheias de grampos. E considerou a cruel necessidade de amar"


A Menor Mulher do Mundo in Laços de Família
Clarice Lispector

Laços de Família

Autora: Clarice Lispector


Opinião: Tenho sempre algum receio de pegar num livro de um autor brasileiro. Habituado como estou ao português de Portugal, há pequenas coisas no português do Brasil que me soam demasiado estranhas e que correm o risco de me influenciar negativamente a leitura.

Já tive, no entanto, boas experiências com livros brasileiros, e este livro de Clarice Lispector é o membro mais recente dessa lista. Em Laços de Família, conjunto de contos sobre o quotidiano, a autora consegue transformar rotinas e situações perfeitamente normais em intensas descrições literárias com uma escrita bastante boa.

Aliás, para se ver que quando a escrita é boa, as diferenças entre as versões do português se esbatem, basta ter em atenção que não é difícil lerem-se alguns destes contos sem se ficar a saber a nacionalidade da autora.

Logo por aí, é bom. Mas achei mesmo que Lispector tem um dom qualquer, porque não é qualquer pessoa que me consegue manter interessado em contos pequenos que são, basicamente, a descrição de um jantar de família, a ida para a escola de uma rapariga e outras coisas igualmente banais.

O que a autora faz de forma fantástica é, como já disse, dar intensidade a essas descrições, seja através da sua escrita praticamente irrepreensível ou da perspectiva pessoal e altamente modelada que usa para contar as histórias, pondo-se na pele das várias personagens e transmitindo na perfeição o que cada uma sente.

Isto é muito interessante, e faz algo que me agradou bastante: cria um certo conflito entre diferentes tons dos narradores, que variam ao longo de cada história. Esses tons, criados e controlados pelas emoções e pela mente das personagens, digladiam-se sem que nenhum ganhe nem perca, mas sim até a história acabar, em constante contraste bem encenado por Lispector e que só beneficia os contos.

Mesmo assim alguns dos contos não conseguem erguer-se acima da banalidade desinteressante – são aqueles em que a escrita da autora brilha menos – criando assim uma divisão entre os contos, entre os banais que conseguem cativar e os banais que não passam disso mesmo.

Além da escrita e destas particularidades das histórias e dos narradores, os temas abordados são profundos e terra-a-terra, misturando preocupações do dia-a-dia com questões mais existenciais de forma harmoniosa e tornando o livro fantasticamente citável.

Por isto tudo, aconselho a leitura deste Laços de Família, mesmo aos mais cépticos. Lispector já me foi aconselhado várias vezes, e também não acreditava muito que fosse gostar grande coisa, mas desenganem-se: o livro é bom, a escrita é muito bom, e a autora é, no mínimo, intrigante!

sábado, 19 de abril de 2014

Estantes Emprestadas [4] - Guia de sagas e calhamaços [2/2]



Cá está a segunda parte da crónica do Rafa (podem ler a primeira AQUI). Depois de introduzido o tema, começa de facto o guia, que está uma categoria do caraças. Nem referiu Malazan!

Mas levem as sugestões dele a sério, que ele normalmente acerta (excepto com Malazan). Em parte por culpa dele já li Sanderson e Abercrombie, pelo menos, e recomendo vivamente! Também já li Malazan por causa dele, e só vos digo que ele ainda vai a tempo de apanhar um enxerto de porrada...

De qualquer forma, da minha parte, obrigado pela excelente crónica, Rafa!


Um Breve Guia de Sagas

Agora que convenci alguém a dedicar algum tempo a uma saga coloca-se outra questão: por onde começar?

Em termos literários, os géneros que mais associo a grande colecções são os policiais, os westerns, os romances históricos, a fantasia e a ficção científica.

Como já mencionei sou um grande fã de fantasia e ficção científica (suspeito que foi por isso que o Rui me sugeriu este tema, que eu estou sempre a tentar impingir-lhe colecções e sagas, com sucesso variado) e por isso vou deixar o "melhor" para o fim.

Partindo do princípio que o leitor já tem uma ligeira ideia do tipo de livro que aprecia, se quiser optar pelo policial existem inúmeras possibilidades.

Para começar acho que é importante separar policiais baseados em lógica como é caso de Sherlocks Holmes (de Arthur Conan Doyle e Agatha Christie) e os policiais noir (como por exemplo os de Raymond Chandler). Pessoalmente eu aprecio bastante a lógica nos livros de Sherlock Holmes (apesar da grande maioria serem contos) mas também gosto imenso do ambiente noir dos livros de detectives hardboiled, por isso sugiro que se experimente um de cada e depois logo se vê. Independentemente do gosto de cada um, a minha sugestão é a colecção Vampiro, da editora Livros do Brasil (já cá voltarei) que tém montanhas de livros (todos eles policiais, se não me engano) de vários autores, desde Agatha Christie a Dashiell Hammett (respectivamente autores de policiais que recorrem mais à dedução e à investigação por detectives "durões"). Ainda há a enorme vantagem de ser fácil de encontrar livros nesta colecção a um preço mínimo na feira do livro, de modo que o único problema será mesmo arranjar espaço para os livros.

Sobre os Westerns não tenho muito a dizer, principalmente porque até agora nunca me dediquei a sério a este género, não por falta de interesse, mas mais por não saber bem por onde começar (um guia sobre westerns daria imenso jeito, mas sem ter lido eu próprio não me sentiria confortável debitar informação lida noutro sítio). Os Westerns são também fáceis de encontrar, a preços reduzido em edições antigas, semelhantes à colecção vampiro.

Tanto os policiais como os westerns, em geral são livros pequenos e que se lêem facilmente, mas já a seguir vou passar a um tópico que contem verdadeiros monstros de livros, incluindo aquele que é, para mim o melhor livro de todos os tempos (e um dos maiores), o Conde de Monte Cristo.

Os romances históricos são também propícios a seguir personagens durante a sua vida praticamente toda, por vezes seguindo para as gerações seguintes e são livros que nunca mais acabam. Por outro lado têm um especial interesse para pessoas que, como eu, gostam bastante de história, de modo que nunca me chega a cansar. 

Dos romances históricos posso destacar os grandes clássicos franceses, como Dumas (que eu a modos de que idolatro) que escreveu livros excepcionais sobre a revolução francesa (por exemplo o Cavaleiro de Maison Rouge), ou os clássicos russos, como Tolstói (aviso que é preciso muita coragem para lidar com Tolstói, que tem uma escrita bastante densa). Na verdade, qualquer país com um mínimo de história consegue material para um romance histórico, em particular a Era Tudor em Inglaterra e o governo dos Médici de Florença são bons exemplos.

Claro que este nosso cantinho também deu origem a romances históricos, creio que o nome de Saramago será familiar, mas mesmo nos romances estrangeiros encontramos portugueses, desde os descobrimentos, por vezes vistos como heróis (por exemplo nos livros de Emilio Salgari, sobre o pirata Sandokan, o tigre da malásia, que tinha um primeiro imediato português) e por vezes como vilões (como no Shogun de James Clavell, passado no Japão).Temos de tudo neste género, desde intriga palaciana a confronto com piratas, passando por ninjas e fantasmas vingativos.

Finalmente chegámos às categorias pelas quais tenho um fraquinho especial: Fantasia e Ficção científica.

Tal como nos romances históricos, a FC também tem os seus clássicos, nomeadamente aqueles que são considerados os Pais da FC moderna, Arthur C. Clarke, Robert Heinlein e Isaac Asimov. Apesar de ser Clarke o autor do meu livro de FC preferido (Childhood's end, que não posso recomendar o suficiente), tenho de destacar Asimov, por ter criado um universo gigantesco, que reúne duas das suas principais sagas num periodo de dezenas de milhares de anos, um feito de uma complexidade brutal, visto que Asimov era um autor prolífico. Outro autor que criou um universo bastante interessante é Orson Scott Card, com o seu Enderverse (o seu primeiro livro deu origem ao filme O Jogo Final), mas que pode ser demasiado militarista para algumas pessoas. Dezenas de outras sagas podem ser encontradas na colecção Argonauta, da editora Livros do Brasil (eu disse que já cá voltávamos), que são um euro cada na feira do livro.

Agora a Fantasia, é um género que está em expansão devido ao reconhecimento que George R.R. Martin tem recebido para a sua saga de fantasia As Crónicas de Fogo e Gelo, que dispensa apresentações. Apesar de ter aproximado a fantasia do público mais mainstream, também subiu a fasquia para a fantasia mais recente, especialmente a fantasia mais realista e visceral. Para quem for fã de Martin a minha sugestão é qualquer coisa escrita por Joe Abercrombie, que é para mim o melhor autor desse tipo de fantasia (a chamada dark fantasy). Cria personagens brilhantes e dá-lhes vida e o que é mais importante, individualidade com uma escrita igualmente genial. Não são todos os autores que conseguem que uma pessoa perceba de que ponto de vista é um dado excerto simplesmente pela forma de falar ou pensar de uma personagem. Infelizmente Abercrombie é um autor relativamente recente, tendo apenas 6 livros (uma trilogia e três sequelas até agora, todos eles fantásticos), de modo que facilmente se esgota.

Felizmente, temos Brandon Sanderson, um autor que eu não me cansei de impingir ao Rui, até que finalmente ele acedeu a ler os Mistborn, e que escreve que se desunha(suspeito que no caso dele deve ser mesmo literal, que é absurdo a velocidade a que escreve). Outro autor, Patrick Rothfuss comentou que a capacidade de Sanderson de lançar livros de qualidade o envergonhava (e com razão, que a sua trilogia na forma de uma autobiografia de uma lenda está para terminar há algum tempo). Sanderson consegue escrever um livro de 1200 páginas em pouco mais de um ano, com pausas para escrever alguns com 300 páginas ou umas novelas mais pequenas (Martin é outro que podia aprender com este autor, que tem demorado mais de cinco anos por livro).

Na parte da fantasia mais divertida tenho de destacar Terry Pratchett, que antes de J.k.Rowling era o autor mais lido de Inglaterra, com a sua saga de mais de 40 volumes de sátira e paródia a, bem praticamente tudo. Discworld é um universo gigantesco, que além da saga principal tem vários spin-offs como a Science of Discworld, quando o nosso universo é aparentemente criado por acidente. Pratchett colaborou com outro autor inglês, Neil Gaiman, o autor de Sandman, para escrever um dos livros mais engraçados que já li, Good Omens (tendo em conta o humor inglês, sugiro que se leia em inglês). Neil Gaiman também escreveu Anansi Boys, uma sequela ao American Gods, o melhor livro de fantasia urbana que já li, mas mais semelhante ao Good Omens, pelo número de vezes em que me desmanchei completamente a rir.

Todos estes autores têm uma escrita que melhor ou pior é de leitura fácil, particularmente quando é humorística, mas antes de terminar quero mencionar um autor que provavelmente não é o melhor do ponto de vista de principiantes de sagas, China Miéville, outro britânico. Miéville tem a melhor escrita que já encontrei na fantasia, que usa para descrições curiosamente perfeitas das sociedades distópicas que povoam os seus livros. O facto de ser doutorado em política também se nota na sua obra, que é recheada de crítica inteligente às políticas actuais e em geral à sociedade. Ainda por cima tem uma imaginação estranhíssima (tenho de usar muitos superlativos com este autor) o que provalmente não irá agradar a toda a gente (eu cá sou um bocado estranho e os meus amigos são também bastante estranhos por isso não tenho grandes problemas com Miéville, mas que consegue ser perturbador, consegue).

Finalmente, e porque não posso falar de fantasia sem falar dele, Tolkien, o chamado Pai da fantasia. Tolkien pode ser criticado pela superficialidade das suas personagens, quando comparado como Martin por exemplo (algo de que eu me poderia queixar, mas acho que já me desviei de tópico vezes suficientes), mas criou um universo épico, em todos os sentidos do termo, com uma cultura e história rica, várias línguas e ao mesmo tempo que dava origem a um género, a fantasia épica. Hoje em dia, muitos leitores menosprezam o contributo deste homem, mas sem ele não haveria o panorama da fantasia actual. Tirando o Hobbit(que é mais juvenil), a restante obra de Tolkien, especialmente o Senhor dos Anéis e o Silmarillion (que é particularmente complicado e denso) são um excelente ponto de partida para a fantasia adulta.

Quando alguém consegue ler estes livros já não deve ter problemas com sagas e calhamaços (excepto talvez com ensaios sobre filosofia) e pode atirar-se sem preocupações a obras como a Roda do Tempo com os seus 14 volumes gigantescos ou o Dune, que tem 7 volumes "principais" e mais uns quantos spin-offs.

Boas leituras!

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Disney Big #3


Argumento: Rudy Salvagnini, Giorgio Pezzin, Bruno Concina, Michele Gazzarri, Carlo Panaro, Giorgio Figus, Alfredo Saio, Andreina Repetto, Bruno Mandelli, Carlo Chendi, Bruno Sarda, Mauro Monti
Arte: Lino Gorlero, Giorgio di Vita, Giampiero Ubezio, Giampaolo Soldati, Luigi Piras, Marco Rota, Giorgio Bordini, Giuseppe Perego, Guido Scala, Massimo di Vita, Maurizio Amendola, Alberico Motta, Luciano Gatto, Massimo Dotta, Giovanni Romaini, Carlo Limido

Opinião: Tinha boas perspectivas para este volume. Olhem bem para esta capa! A arte não é a mais fantástica de sempre, mas é boa, e tem o Mickey em versão suportável e o Pateta em versão fixe: são vikings! Com direito a um dracar e tudo...

E começa bem. As primeiras cinco histórias são sobre Mickan, o Bárbaro, ou como carinhosamente o trato "Mickey em versão suportável", sempre acompanhado do fiel Pathetor. Aqui não há mistérios irritantes que o Mickey tem que resolver pensando durante cerca de dez segundos, nem grande parte das características habituais da história deste irrit... famoso rato.

Aquilo que há é espectacularidade viking. Bárbaros! Espadas! Porrada! Dragões! Foi mesmo muito bom para começar. E depois são quatro histórias antigas do Tio Patinhas - a mais recente é de 1984! - com os desenhos simplistas e cores fora do sítio a acompanhar as premissas invariavelmente estapafúrdias mas bastante engraçadas do costume. Não Patinhas no seu melhor, mas é sempre agradável ver os seus confrontos com os Metralhas, especialmente com o melhor Metralha de sempre, o Avô Metralha.

É então que decidem estragar-me a leitura.Três histórias típicas do Mickey, das quais já estão fartos de saber a minha opinião, algo sofríveis e com coisas ainda mais idiotas do que o costume, mesmo descontando o factor "isto é para putos". A minha favorita foi o Mickey cheio de medo que o Mancha Negra tivesse desenvolvido uma forma de ter campos magnéticos a afectarem coisas à distância.


Bem, o livro depois compensa com umas historietas do Pateta e do Donald que raramente falham, embora não tenham sido nada de especial. Tenho pena que esta colecção não esteja a ter a qualidade que podia ter, mas a verdade é que está bastante boa e consegue manter o interesse (e a minha vontade de gastar dinheiro com ela), portanto não me vou queixar muito. Só gostava de ver um pouco mais das tendências demonstradas nos dois primeiros volumes de incluir personagens mais obscuras.

Ah, e gostava que dessem menos tempo de antena ao Mickey. A não ser que esteja em formato viking!

quinta-feira, 17 de abril de 2014

Preconceito do Fantástico

Quase todos os géneros literários enfrentam algum tipo de preconceito, alguma vez na vida. Mas se existe um grupo que sofre bastante com isso, é o Fantástico.

Seja Fantasia, Ficção Científica, Horror ou outra variante qualquer, deve ser difícil encontrar um género que seja mais frequentemente atirado para a lama literária do que estes três. Muitos académicos nem sequer os consideram géneros literários "a sério", e também é assim que pensa muita gente.

Não tenho a certeza se já refilei sobre isto, mas tenho sempre tanta coisa a dizer de um assunto destes, que não se perde nada. Porém, desta vez, prefiro reencaminhar-vos para o texto do Marco, n'O Senhor Luvas.

Aquilo que ele diz sobre a FC é aplicável aos outros dois géneros de que falei, com pequenas modificações que vocês são inteligentes o suficiente para fazer. Quero só destacar uma frase:

"Atrevo-me a dizer que a FC não é um género, mas um trans-género pois agrega outros. Mas mais do que ser um género ou trans-género ou outra coisa a FC é fonte de grandes historias."

Têm aqui a essência daquilo que eu próprio acho sobre a FC (e a fantasia e até o horror, ainda que em menor grau), e aquilo que é responsável, em parte, pelo grande interesse que estes géneros despertam em algumas pessoas.

Como podem ver, aquele texto é interessante... Vejam por vocês próprios!

quarta-feira, 16 de abril de 2014

The Well of Ascension (Mistborn #2)


Autor: Brandon Sanderson


Opinião: Ainda só é o segundo livro que leio de Sanderson, e já sei perfeitamente que o homem não desilude. Mas parece que tenho um problema com os finais dele. Já vão perceber porquê, daqui a nada.

Por agora vamos falar das coisas boas, que são mais do que suficientes para me ter deixado bastante satisfeito com a leitura deste livro. Aliás, ainda nem ia a meio e já estava farto de dizer a quem quisesse ouvir (e a alguns que nem faziam muita questão) que estava a gostar mais deste. E de que maneira!

Se tiverem lido a minha opinião anterior, podem imaginar o quanto gostei de ler este The Well of Ascension. Já para não falar de que fiquei genuinamente supreendido, pois as trilogias costumam vacilar um pouco no volume do meio.

O motivo para ter gostado é simples: este volume explora o universo criado no primeiro, sem ter que perder muito tempo em apresentações, introduções e explicações. Essas três coisas foram grande parte do que causou o ritmo oscilante de The Final Empire, que ora nos deixa sem fôlego com os seus momentos de acção rápida, como se espraiava a explicar, com calma e paciência, os detalhes do que se estava a passar.

Foi preciso apresentar um grande leque de personagens, explicar uma mão cheia de conceitos e desenvolver com calma a história daquele mundo, para que a trama se perceba como deve ser.

E neste não há nada disso. Da primeira à última página praticamente não há pausas. A sensação que tive foi a que estava sempre a acontecer alguma coisa, que todos os capítulos eram um passo em frente no enredo e que tudo o que aconteceu era de alguma forma relevante. E é verdade!

Sanderson não se deixa deslumbrar com os conceitos que imaginou, e desenvolve bem a história, que já tinha cuidadosamente planeada e preparada desde o início do primeiro livro. Isso nota-se, por vezes, em coisas muito subtis, mas às tantas apercebemo-nos e o espanto e a satisfação são indescritíveis.

Ainda assim, e com tanto a acontecer, o autor consegue apresentar mais personagens marcantes (com destaque positivo para Zane, o psicopata de serviço, e negativo para Tyndwil, a chata de serviço), e o desenvolvimento que dá a algumas já conhecidas é espantoso, como se pode ver por Sazed, que tem das evoluções mais graduais e lógicas, e por Breeze, cujos capítulos foram dos que mais gostei de ler pela forma como nos davam a conhecer melhor o homem por detrás do burlão. Verdadeiramente fascinante.

Se fosse falar de tudo corria novamente o risco de nunca mais me calar. O mundo que Sanderson criou é rico e diverso, bem estruturado e com um sistema de magia original e bem definido, que não se crucifica em inconsistências pelo simples facto de estar bem pensado. Por esse lado, é interessante lerem o que o homem tem a dizer sobre sistemas de magia: aqui, aqui e aqui.

Por fim falta-me falar do que não gostei. A protagonista, Vin, por mais badass que sejam alguns dos momentos que protagoniza, como explodir com a cabeça de homem à cabeçada, e interessantes que sejam as suas interacções com Zane, tem momentos verdadeiramente irritantes, complementados por Elend, feito Rei. São os dois bastante novos e isso nota-se nos seus dilemas, que por mais sentido que façam enquadrados nas personagens, me irritaram profundamente.

A outra coisa de que não gostei, ou melhor, de que gostei menos, foi o fim. Mas mais por me ter desiludido do que por não ser bom. Aquilo que acontece de facto torna-se relativamente óbvio ainda longe do fim, e a grande revelação, mesmo a ligar perfeitamente com algo insuspeito que aparece no livro anterior, só é revelação para as personagens, o que lhe tira a maior parte do seu peso.

Só por isso é que o livro não leva pontuação máxima. Estava mesmo muito bom até às últimas páginas, demasiado bruscas e insatisfatórias. Concedo, no entanto, que são um final fantástico para o livro, uma vez que ainda deixa muita coisa em aberto e deixa o caminho preparado para o terceiro volume com um cliffhanger daqueles...

Vou aproveitar as próximas leituras para desanuviar um pouco e deixar este livro assentar antes de pegar no terceiro, mas a verdade é que mal posso esperar e sei perfeitamente que só lhe devia pegar no Verão, porque corro o risco de não fazer mais nada até o acabar!

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Os Vingadores #2


Argumento:  Jonathan Hickman
Arte: Jerome Opeña

Opinião: Se o primeiro número foi uma boa introdução ao Universo Marvel, nomeadamente ao canto dos Vingadores, este número desenvolve-se demasiado rapidamente, com demasiadas coisas ao barulho.

O suficientes para conseguirem perder um leitor novo, por exemplo. Acho que o argumento tenta, de certa forma, evitar isso mesmo, com cada comic a começar com uma pequena introdução (que nunca aborrece) à personagem em torno da qual a acção vai rodar.

Pode fazê-lo sob a forma de flashback, narrativa em paralelo ou usando o facto da própria personagem não se lembrar de grande coisa, mas esforça-se sempre para que as coisas não andem a cair do céu.

(esta última frase tem muito mais piada se já tiverem lido isto e souberem o que acontece quando se brinca com coisas que caem do céu)

No entanto acho que foi uma passagem demasiado brusca. É claro que o principal público-alvo destas coisas é o pessoal que tem acompanhado e que conhece isto como deve ser, mas para quem estiver a começar agora a acompanhar a história, aproveitando o reset, pode ser mais complicado.

Tirando isso, não tenho grande coisa a apontar para além de que gostava de ter visto um desenvolvimento da história de forma mais focada, em vez de andar já a espalhar a narrativa por vários pontos de vista (por mais interessantes que sejam). Eu compreendo que sendo esta uma revista sobre os Vingadores, uma equipa composta por dezenas de membros, e a maior parte adorada pela generalidade das pessoas, não se pode dar ao luxo de ignorar algumas das suas personagens fulcrais durante demasiado tempo, mas pronto.

Por outro lado foi bom ter um vislumbre da vida cósmica destes heróis. Pessoalmente fiquei bastante satisfeito por ver a história a espalhar-se facilmente por um campo de acção alargado, propício a eventos inesperados por estar tanta coisa a acontecer ao mesmo tempo. Só pensando na coisa de forma objectiva é que fico um bocado reticente, por causa da confusão que pode criar a leitores que não estejam tão habituados a lidar com este Universo.

As personagens, como já disse, são muitas, e tirando duas ou três mais secundárias e até agora irrelevantes, são todas personagens bastante fortes e com um grande carisma. Os autores têm conseguido lidar bem com isso, pelo menos, não há personagens a roubar espaço a outras, quer a nível de argumento, diálogos, e de arte. Todas têm os seus momentos.

O problema destas coisas é mesmo que me deixa curioso para ver o que acontece a seguir, embora não tenha uma continuidade tão forte como os X-Men, muito menos a propensão destes últimos para os cliffhangers. Venha o próximo!

sábado, 12 de abril de 2014

Estantes Emprestadas [4] - Guia de sagas e calhamaços [1/2]



Bem-vindos a mais uma Estante Emprestada! A vítima, perdão, o convidado de hoje é o Rafael, mais conhecido por Rafa (ou paspalho), colaborador do Metáfora de Refúgio. Sim, já o terceiro desse blog que vem aqui parar, em quatro pessoas, mas quem fica a ganhar são vocês, que isto é pessoal porreiro e em cujo discernimento literário eu confio. A maior parte das vezes.

O tema de hoje, e como o Rafa explica e justifica, são as sagas e os calhamaços, de que ele é fã e que está sempre a tentar impingir a alguém. Seja um Malazan com 900 páginas, um China Miéville de 1300 ou uma Roda do Tempo que ocupa um metro e qualquer de prateleira, alguma coisa ele há-de ter na manga.

Por hoje ficam só com a introdução, na qual o Rafa vos tenta convencer ligeiramente a ler as coisas que ele sugere. Eu compreendo o que estão a sentir, ele é assim todos os dias.


A pedido de várias famílias (apenas uma na verdade), venho para aqui discursar sobre sagas (seja de FC ou fantasia ou o que for que tenha montes de livros com montes de páginas).

Mas antes de começar, gostava de agradecer ao Rui, por me dar esta trabalheira enquanto estou de férias (sim porque me pediu isto com para aí meio ano de antecedência) e já agora agradeço também a oportunidade de chatear mais pessoas.

O tema que me foi proposto foi sagas e é disso que vou falar.

Ora bem, parece que algumas pessoas ficam algo intimidadas quando encontram livros (que já de si podem ser bem grandinhos) e encontram na capa as palavras:"volume 1 de uma data deles". É a isso que chamo sagas, que podem ser as mais comuns trilogias, ciclos, crónicas, canções... A lista continua, mas acho que chega para exemplificar. 

Em Defesa das Sagas e calhamaços

Infelizmente, as pessoas que se deixam afugentar pelo tamanho e peso de alguns desses livros e pelo espaço que a saga eventualmente irá ocupar na prateleira (a título de exemplo temos a Roda do Tempo, de Robert Jordan, que a 6 ou 7 centímetros de espessura por livro ao longo de 14 livros acaba por ocupar um espaço considerável) não se chegam a aperceber que esses livros são em geral de leitura simples e rápida.

Por exemplo, apesar de não se qualificarem como uma saga(com a excepção claro da Dark Tower), os monstruosos livros de Stephen King, como o "It" e o "The Stand" podem parecer ameaçadores, mas a escrita de King é simples e uma pessoa acaba por ler o livro mais depressa do que se lesse um livro mais pequeno mas mais denso.

Graças à linguagem King consegue escrever livros que mesmo sendo grandes se lêem bem e como ainda consegue desencantar inúmeros cenários assustadores, tornou-se num dos mais celebrados autores de Terror actuais (aproveito para comentar que King considera que a sua magnum opus é uma saga de fantasia/terror de sete livros e por mais extraordinário que possa parecer, os primeiros livros desta colecção são pequenos, dentro do possível claro).

Também poderia dar o exemplo de Harry Potter, também com 7 livros, mas acho que a J. K. Rowling não precisa de mais publicidade.

Por outro lado temos autores que escrevem livros grande e densos, como alguns clássicos russos ou China Miéville, um autor inglês, o porta estandarte do New Weird. Isso complica as coisas, porque significa que a leitura vai ser mais demorada e provavelmente teremos de andar a carregar um livro de um quilo de um lado para o outro (graças aos conselhos de dois colegas, um deles o Rui agora tenho um E-Reader e já não tenho de andar a carregar meia estante de casa para lisboa). Creio que são estes autores que acabam por afastar os leitores dos calhamaços ou  da leitura em geral. Para mim o truque, para quem não costuma ler brutas sagas ou livros monstruosos é começar com uma coisa mais pequena, de preferência de leitura simples e ir complicando, mas já cá voltamos.

Claro que tendo em conta o trabalho que dá ler uma data de livros relacionados de alguma forma, era agradável que houvessem vantagens. Entre elas contam-se a possibilidade de desenvolver as personagens ao longo de um período de tempo mais extenso, aprofundar o universo envolvente (o que é particularmente importante na fantasia, um género em relação ao qual eu sou parcial) ou simplesmente complicar a trama.

Claro que nem tudo são rosas e muitas vezes temos muitas páginas e pouco conteúdo, com sagas que empatam na trama ou são prolongadas para fazer render a fama.

Se com esta conversa alguém já está inclinado a pegar numa saga ( As Crónicas de Gelo e Fogo estão na moda actualmente) depressa vai encontrar outra dificuldade, assim que procurar o primeiro volume numa livraria qualquer, o preço. Se um livro individualmente, em geral não é barato, o que dizer de meia prateleira de livros? Mesmo que se procure os livros em inglês na Amazon (o que já permite poupar bastante) e de preferência num pack com vários livros, continua a ser um investimento considerável (e os packs constituem um risco,o de não gostar dos livros). Felizmente que este problema se resolve facilmente, o nosso país tem uma extensa rede de bibliotecas e em particular em Lisboa temos praticamente uma biblioteca em cada esquina. Esta rede permite o acesso a imensos livros sem qualquer custo!

sexta-feira, 11 de abril de 2014

A Bondade dos Estranhos

Autor: João Barreiros


Opinião: Só existem duas razões para alguém não saber que João Barreiros é um dos meus autores favoritos de sempre: ou esse alguém não convive o suficiente o comigo, ou então não segue o blog há tempo suficiente. Como alguns amigos meus podem comprovar, eu sou um tipo chato, e Barreiros é um dos autores que eu mais tento impingir.

Já lhe li um número razoável de obras, incluindo o magistral Terrarium, que escreveu em conjunto com o Luís Filipe Silva, outro escritor que admiro e cujas críticas ouço com frequência (e atenção, eu prometo) nas sessões da Oficina de Escrita da Trëma, que continua por aí em modo semi-clandestino.

A minha opinião geral é que Barreiros é um fenomenal escritor de ficção científica. A forma como cria universos para as suas histórias e situa o leitor nesses mesmos universos com pistas subtis mas que contextualizam o todo na perfeição... Muito bom, muito bom mesmo!

Mas depois de ler este A Bondade dos Estranhos, fiquei desiludido. A caracterização está lá, mas apressada. As personagens interessantes também, mas exageradas ao extremo. A história tem uma qualidade discutível. Em suma, um livro que fica muito aquém dos padrões de qualidade deste autor.

Vamos devagar. O Projecto Candy-Man era um projecto de Barreiros, do já mencionado Luís Filipe Silva e ainda de outro autor, João Seixas. A ideia era escrevem uma trilogia, iniciada por este livro, dentro deste universo, enriquecendo-o e, imagino eu, contando uma história maior que a soma das três histórias.

Não sei porquê, mas os volumes seguintes não existem. Cada um dos autores ia ter um livro a seu cargo, mas até hoje (e este foi lançado em 2007) só existe este. É uma pena, porque acho que com projectos destes é que o Fantástico português podia avançar como deve ser.

Eu percebo é pouco dessas coisas, portanto vou-me focar mais neste livro. Imaginem que existem três espécies alienígenas a conviver connosco de forma relativamente pacífica, com as habituais intrigas políticas e afins à mistura. Agora imaginem que uma dessas raças decide andar a brincar com seres humanos, dando uns comprimidos especiais a alguns escolhidos que lhes dão alguns... poderes, vá.

Agora imaginem que uma das pessoas que tomaram esses comprimidos é contratada para tomar conta de quinhentos putos (que são mais lagostas do que outra coisa) alienígenas. A ideia é interessante, mas não tanto quanto isso, e a execução parece-me pobre, especialmente para o autor que é.

Barreiros tem um dom para caracterizar cenários, universos e personagens, é certo, mas usa esse dom de forma um bocado caótica ao longo das páginas deste livro. O resultado é uma enorme sensação de "quero saber mais". Acaba por acontecer tudo demasiado depressa, e a informação que Barreiros passa em poucas linhas é pura e simplesmente demasiada para ser assimilada como deve ser.

Talvez isto tenha acontecido por o autor estar mais habituado a contos, onde brilha verdadeiramente? Não tenho a certeza. Sem saber, diria que este livro foi escrito bastante depressa, e que das duas uma, ou é uma expansão de um conto, ou um romance enorme bastante cortado. Porque a sensação é exactamente a de algo incompleto.

Só há uma coisa que me chateou mesmo muito: a protagonista. Deve ser uma das personagens mais irritantes que já encontrei, e embora isso seja levemente intencional, para transmitir a ideia de uma rapariga que não confia em ninguém e que se defende do mundo exterior sendo uma pain in the ass armada aos cucos, essa ideia acaba por transparecer menos do que o facto de ela ser uma chata do caraças. O livro tem 150 páginas e eu já não a podia ver à frente!

E depois, claro, o final apressado não ajudou a nada. É verdade que gostei mais da segunda metade do livro, quando as coisas se desenvolvem como deve ser e os planos estranhos se desenrolam por ali fora, mas continuei a achar apressado e, pior do que isso, sem grande sentido. As motivações pareceram-me fracas, e o fim, ainda que a tender para épico e recheado de conceitos fantásticos, como todo o livro, não me agradou nem um bocadinho. Demasiado simples não é a melhor expressão, mas pronto, foi isso.

Para terminar, eu que normalmente venero tudo o que este homem escreve, vou ter que guardar este livro na estante dos mal comportados. O estilo típico de Barreiros está claramente lá, mas de tal forma diluído que não consegue fazer do livro algo bom.

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Que as citações nos caiam em cima [47]


"Ao contrário do que diz a ciência, existe som no espaço. É certo que o vácuo elimina o som das explosões... Mas, através dos intercomunicadores das naves, os gritos de agonia misturam-se com o ruído da estática."


Inumanos
Carlos Pacheco e Rafael Marin

Inumanos

Título: Inumanos

Argumento: Carlos Pacheco e Rafael Marin
Desenho: Jose Ladronn e Jorge Lucas
Tradução: Paulo Moreira


Opinião: Com uma arte fantasticamente detalhada, este Inumanos convenceu-me de imediato. Pouco ou nada sabia sobre este grupo, para além de que são uma espécie de X-Men, mas meio alienígenas, futuristas, e bastante mais dramáticos.

Ou seja, não tinha expectativas de nenhum tipo, não sabia mesmo o que esperar. Aquilo que encontrei foi um bom worldbuilding, com uma história que não achei particularmente cativante, talvez por me faltar algum contexto, mas que apreciei e me despertou a curiosidade.

Os diálogos é que me deram ânsias. Não sei se é problema de tradução ou se já são assim de origem, mas estão mesmo muito maus. Artificiais, ridículos e muitas vezes desnecessárias, já que a arte é tão expressiva que conta a história praticamente sozinha.

Basicamente, os Inumanos são os descendentes de uma antiga raça extraterrestre, e vivem isolados e sossegados num canto escondido do nosso planeta, até ao momento em que o que sobra dessa raça extraterrestre aparece, sob a forma de Ronan, o Acusador (um dos vilões do próximo filme da Marvel, Guardians of the Galaxy).

A partir daí há porrada, traições, chantagem, esquemas políticos que brincam com as hierarquias de várias galáxias, e por aí fora, numa mistura entre space opera e a "comum" história de super-heróis.

Não fiquei fascinado, em grande parte graças aos diálogos execráveis, mas fiquei certamente com curiosidade, e se a oportunidade surgir, não hesitarei em ler mais sobre este grupo.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

X-Men #2


Argumento: Brian Michael Bendis
Desenho: Stuart Immonen, David Marquez
Tradução: Filipe Faria

Opinião: Como se pode ver pela capa, este segundo número é bastante focado em Jean Grey, uma das mutantes mais poderosas, controversas e ressuscitadas de sempre. Não tenho a certeza se sou grande fã dela, porque além dos momentos overpowered, não me parece a personagem com as melhores escolhas à face da terra (quem é que no seu perfeito juízo gosta mais do Ciclope do que do Wolverine?).

No entanto fiquei agradado com a forma como aparece nesta nova linha narrativa. Depois de no primeiro número Hank McCoy, o Besta, ter andado a brincar com o passado e o futuro, eis que nos deparamos com a situação crítica de ter o Ciclope do presente e o seu bando de mutantes renegados e ligeiramente fascistas a esbarrarem com os X-Men originais.

Não é das piores histórias que já vi, e o motivo de Besta é bastante razoável, ainda que um bocadinho demasiado complicado: quer confrontar Ciclope com uma versão sua mais inocente, para que ganhe consciência do quão errada é a sua conduta actual.

Pessoalmente não percebo bem como é que isto é mais simples do que dar-lhe um enxerto de porrada até ganhar juízo, ou tentar dialogar de forma razoável com aquele que é um dos membros mais pacifistas e choninhas dos X-Men. Mas é assim que funciona no mundo dos super-heróis!

Como não podia deixar de ser, a história está recheada de confrontos, encontros, reencontros e comparações entre os X-Men originais e os actuais. O Hank McCoy do passado passa o tempo todo a tentar salvar o seu eu futuro, cuja mutação auto-infligida (a que o deixou peludo e azul) o está a matar; o Homem de Gelo do futuro e o do passado passam o tempo a comparar-se um ao outro e a assustarem-se um com o outro; o Ciclope do passado consegue tornar-se mais irritante do que o Ciclope original; o Anjo original acha estranho que o seu eu futuro não esteja em lado nenhum, e o momento em que o encontra é dos mais peculiares; e quase todas as personagens olham para a Jean Grey do passado com um misto de saudade e horror.

No entanto a história acaba por se focar mais na personagem de Jean Grey, que por um lado é a causa de muita coisa má que aconteceu a este grupo de rejeitados da sociedade, mas que por outro sempre foi um dos seus membros mais valiosos, poderosos e icónicos. Achei muito interessante a forma como as personagens lidam com ele: desde Wolverine, sempre durão mas claramente quase a quebrar, a Kitty Pride, que não era a maior fã de Jean, mas que cria uma ligação muito forte com esta Jean.

Por esse lado, as relações ficaram muito bem exploradas. Já para não falar que a interacção entre os Homens de Gelo e os Bestas é hilariante e espectacular.

Agora, onde é que isto vai levar? O confronto entre o grupo de Ciclope o grupo de X-Men "oficial", ajudado pelos X-Men originais, ainda deve andar longe. Pelo menos o definitivo. Mas os jovens pareciam bastante determinados. Não tenho a certeza de quais as consequências que isso vai trazer, mas estou certamente curioso. Apenas gostava de ver mais explicações, ou melhor, mais dicas das relações anteriores, porque isto de cair aqui de pára-quedas, por muito reset que tenha havido, só é engraçado até um certo ponto. Mas tirando isso... Bom trabalho que para aqui vai.