Título: Terna é a Noite
Autor: F. Scott Fitzgerald
Tradutor: Maria Filomena Duarte
Sinopse: Uns anos mais tarde, a jovem actriz Rosemary Hoyt ainda se lembra da forma idílica como conheceu o casal Diver. Os primeiros dias das suas férias na pequena povoação de Cannes, na Riviera Francesa, foram aborrecidos, mas a sorte de Rosemary muda quando conhece Dick e Nicole Warren Diver, acabando por provocar um abalo na relação do casal. O aparecimento do milionário Tommy Braban complicará ainda mais a relação dos Diver. Escrito nos anos 30, o romance é muitas vezes apontado como autobiográfico. Coincide com o internamento da mulher num hospício e com o fim do casamento do próprio Fitzgerald, que acaba por se refugiar no álcool.
Opinião: Terna é a Noite é o primeiro volume daquela que é, muito provavelmente, a melhor colecção que eu já vi sair num jornal: a Não Nobel. O conceito é fascinante (deixo mais sobre este assunto para mais tarde), reúne não uma, mas várias mãos cheias de autores interessantes, e tem uma qualidade estupidamente boa, para aquilo que é normal nestas colecções.
Ora bem, quanto à história, que é, muito provavelmente e como vi escrito algures, autobiográfica, tenho a dizer que me parece ser um perfeito retrato da decadência de toda uma geração, na primeira metade do século XX, nomeadamente a americana. Numa época em que ser diletante era a norma, ou seja, muitos sonhos, muitas iniciativas, mas poucos resultados, o livro começa por relatar a história de Rosemary, uma jovem actriz, e da sua mãe, que gere a sua carreira. Praticamente toda a primeira parte do livro é dedicada a estas duas personagens, principalmente a Rosemary, dando até a entender que aquela é a personagem principal, quando na realidade são duas personagens que ela conhece que são as principais, apesar de a jovem actriz também ter alguma relevância ao longo de toda a obra.
Essas personagens são Dick e Nicole, os Diver: ele, um psiquiatra com aspirações a escritor, é uma pessoa encantadora, que é apresentado como sendo perfeito, especialmente quando visto pelos olhos de Rosemary, mas que se revela como um ser atormentado; ela, uma pessoa deslumbrante, com um passado que não gosta de lembrar e um pequeno grande segredo, que tenta a todo custo manter escondido da sociedade em geral.
A segunda parte do livro dedica-se as estas duas personagens, contando o seu passado até ao momento em que conhecem Rosemary, e continuando a partir daí, especialmente no que toca Dick, que começa a segunda parte como um jovem sonhador e ambicioso, mas que é confrontado com uma vida demasiado turbulenta e com uma mulher com um passado difícil que por vezes encontra o seu caminho até ao presente. Isto leva a uma lenta decadência, paralelamente a toda a geração, que o faz terminar a segunda parte num estado verdadeiramente deplorável e que o marcará para o resto dos seus dias.
Na terceira parte do livro nem Dick nem Nicole são os mesmos. Nem Rosemary! Esta, de criança inocente, acabou por se tornar numa jovem mulher segura de si mesma, enquanto que Dick se tornou amargo e derrotista, verdadeiramente esgotado e psicologicamente exausto, acompanhado por Nicole, cada vez mais frágil.
A história é interessante, típica da altura em que foi escrita, ao retratar a alta sociedade, realçando os seus defeitos e excessos, com uma escrita minuciosa e agradável. O título, curioso, é retirado de "Ode to a Nightingale", um poema de John Keats, e é, para mim, representativo daquilo que é comum às personagens deste livro. A simpatia que tinham à noite e à calma e benéfica escuridão que esta oferecia, como forma de escaparem e de descansarem, inclusivamente de si mesmos.
Gostei bastante, e aconselho.