quinta-feira, 30 de junho de 2011

Que as citações nos caiam em cima [10]

Tinha que aparecer alguma coisa deste grande escritor, José Saramago. Especialmente depois de ter ficado absolutamente deliciado com esta obra, "As Intermitências da Morte".

"Aí está uma palavra que soa bem, cheia de promessas e certezas, dizes metamorfose e segues adiante, parece que não vês que as palavras são rótulos que se pegam às cousas, não são as cousas, nunca saberá como são as cousas, nem sequer que nomes são na realidade os seus, porque os nomes que lhes deste não são mais que isso, os nomes que lhes deste"

José Saramago, "As Intermitências da Morte"

terça-feira, 28 de junho de 2011

As Intermitências da Morte


Título: As Intermitências da Morte
Autor: José Saramago

Sinopse: "No dia seguinte ninguém morre." Assim começa este romance de José Saramago. Colocada a hipótese, o autor desenvolve-a em todas as suas consequências, e o leitor é conduzido com mão de mestre numa ampla divagação sobre a vida, a morte, o amor, e o sentido, ou a falta dele, da nossa existência.

Opinião: Saramago não pára de me surpreender. A cada livro que leio descubro particularidades novas, e apesar de este ser apenas o terceiro livro que leio dele (e todos este ano!), acho que já tenho o direito a afirmar que Saramago é dos meus autores favoritos.

Nesta obra são visíveis todas as marcas (acho eu), da típica escrita saramaguiana: o estilo oralizante, a pontuação pouco ortodoxa, os apartes, os diálogos "corridos"... Enfim, tudo aquilo que é diferente em Saramago e que tanto contribui para o reconhecimento que tem, tanto a nível nacional como a nível mundial.

E esta história é particularmente... Nem sei, fascinante? Bizarra? Mesmo ao meu gosto? Um bocado de tudo isso e muito mais, suponho. Ao contrário do Evangelho e do Memorial, autênticos romances históricos especulativos com um pendor de realismo mágico (especialmente o Memorial), este livro é um tipo de livro bem diferente. Não é propriamente uma alegoria, talvez seja mais uma fábula... É um estilo muito próprio do autor, que consegue misturar vários tipos de histórias e de formas de as contar, baralhando e misturando e criando coisas novas a cada linha que passa.

Neste caso trata-se de uma história que se inicia de forma abrupta, como me parece ser costume nos livros de Saramago, com uma frase bastante simples, mas que acarreta as mais variadas implicações: "No dia seguinte ninguém morreu.". A partir deste momento, e numa primeira parte, o autor escreveu quase que um ensaio especulativo, em que imagina um acontecimento e desenvolve as consequências dessa situação, num país sem nome, com personagens sem nome, o que acaba por universalizar a história, não ocorrendo em nenhum sítio em especial, com nenhuma população em particular, mas sim em todos os sítios e com todas as populações. As Intermitências da Morte, enquanto livro, é, nesse aspecto, bastante abstracto.

Numa segunda parte, a morte decide dar uma reviravolta ao assunto, assumindo publicamente, através de uma carta, que aquele interregno de mortes tinha sido uma mera experiência que não tinha corrido bem e que, portanto, iria voltar ao sistema antigo, embora com algumas alterações. Novamente o autor desenvolve as consequências desta mudança, a todos os níveis, do Clero ao povo, incluindo as casas mortuárias, os hospitais, os lares de idosos, a máphia (com ph sim senhor)... E depois, por fim, uma terceira parte, final, em que a morte enfrenta uma situação bizarra que vai ter que resolver, acabando por haver uma reviravolta final deveras emocionante.

Nas duas primeiras partes, como não podia deixar de ser, o autor desenvolve toda a sua crítica, ironia e o seu humor mordaz, espingardando para todos os lados, atingindo todas as camadas da sociedade e revelando aquilo que há de pior (e, em casos excepcionais, de melhor) em todos os grupos sociais. Na terceira parte já há uma narrativa mais típica, com personagens, ainda sem nome, a morte, com letra minúscula, sempre, e o violoncelista. Bem, talvez a morte seja a única personagem com nome, mas ela própria assume que esse é apenas o nome pelo qual é conhecida, não sendo exactamente o seu nome.

Gostei muito, como é óbvio. As críticas de Saramago são sempre certeiras, acertando em cheio na ferida, esfregando-lhe sal e despejando-lhe álcool em cima, de tal forma que é quase doloroso assistir à desconstrução sistemática das convenções sociais, revelando aquilo que cada uma tem de mais podre. Perdoem-me as analogias demasiado prosaicas, como diria a minha professora de português deste ano, mas esta é a única forma de falar de um autor como este, que se cria enquanto narrador fora do normal, sem medo de dizer as coisas e de acusar quem merece ser acusado, nesta história que começa como crítica mais do que certeira e acaba surpreendentemente doce, com a humanização da morte e revelando, pouco a pouco, a sua necessidade de se sentir amada, até humana.

Aconselho e digo mais, como já disse a Alice, não ler Saramago é crime.

sábado, 25 de junho de 2011

Biografia: José Saramago

Título: Biografia: José Saramago
Autor: João Marques Lopes

Sinopse: Nas páginas da primeira biografia do Nobel da Literatura português, acompanhamos o percurso de José Saramago, desde o seu nascimento na Aldeia da Azinhaga até à mudança para Lanzarote, descobrimos a sua obra e ficamos a conhecer em detalhe a vida daquele que é um dos mais importantes escritores da história da literatura portuguesa.

Opinião: Podia ser apenas um escritor polémico e genial, ou apenas um homem fascinante e extremamente crítico, mas Saramago-homem e Saramago-escritor eram duas facetas interligadas do nosso único Nobel da Literatura, algo que se nota na perfeição nas suas obras, em que a figura abstracta de um "narrador" se esbate e quebra todas as convenções, dando lugar a um autor que conta histórias de forma directa, sem intermediários ficcionados. Junte-se a isto o seu estilo, o chamado estilo saramaguiano, que entrelaça a escrita com a oralidade, e aquilo que se obtém ao ler um livro seu é a sensação de estar frente a frente com o autor, a ouvir as suas histórias.

No entanto e como não podia deixar de ser, apesar de esta biografia permitir um estudo e um entendimento muito mais aprofundado das obras de Saramago, foca-se essencialmente no Saramago-homem, e é a partir daí que se vê que o homem e o escritor se encontravam irremediavelmente misturados. E talvez fosse por isso que Saramago era tão polémico, porque ao dizer aquilo que escrevia (se é que me faço entender), a sua ficção deixava de ser ficção e tornava-se numa arma de protesto ou de simples consciencialização. Não que a maior parte dos outros autores não o façam, mas Saramago fazia-o com uma mestria fora do normal.

Gostei bastante de ler esta biografia sobre um autor que muito admiro e cujos livros muito aprecio, pois permitiu-me ficar a saber bastantes pormenores acerca da sua vida, inclusive episódios cómicos, como o dia em que, ainda a trabalhar como serralheiro, não se levantou à passagem dos chefes, ao contrário de toda a gente, continuando sentado, a almoçar calmamente. Embora não fosse ainda declaradamente apoiante de ideias comunistas, já tinha uma espécie de "comunismo hormonal", como é dito neste livro, e que também se nota sempre ao longo de muitas das suas obras.

De relevo há ainda o prefácio de João Tordo, que mostra uma enorme admiração por Saramago, tanto o homem como o escritor. Acho que posso, portanto, afirmar que João Marques Lopes teve sucesso na tarefa a que se propôs, a de relatar a vida de um dos maiores escritores da nossa língua, mantendo-se objectivo tanto quanto possível, ora falando dos casos em que Saramago sai bem visto, ora falando dos casos em que Saramago sai mal visto, seja o veto ao Evangelho Segundo Jesus Cristo, seja o saneamento dos 22 jornalistas do DN em Agosto de 1975. Ambos os casos (e outros, não fosse Saramago uma das figuras mais polémicas de que há memória) são descritos com a maior das correcções e objectividade, explicando muito bem explicado cada uma das situações.

Se Saramago já era um dos meus autores favoritos (com apenas 2 livros lidos!), graças a esta biografia posso afirmar que é uma minha das pessoas favoritas, na sua totalidade. A sua frontalidade, os seus ideais, a sua convicção e determinação, a sua escrita e as suas obras... Enfim, podia ficar aqui o dia todo. Vou agora partir para a leitura de As Intermitências da Morte, com as expectativas bem em cima e com conhecimento muito maior da obra/vida de Saramago.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Que as citações nos caiam em cima [9]

Desta vez é uma citação dentro duma citação. No livro que estou a ler aparece uma citação de outro autor que achei merecer publicação.

"O vaso dá forma ao vazio, e a música, ao silêncio."

A citação é de Georges Braque, mas está no "A Harmonia é Númerica - Música e matemática", de Javier Arbonés e Pablo Milrud

quinta-feira, 23 de junho de 2011

A Harmonia é Numérica

Título: A Harmonia é Numérica
Autor: Javier Arbonés e Pablo Milrud
Tradutor: João Pedro Piroto Pereira Duarte

Sinopse: Um grande matemático disse numa dada ocasião que a música era "o prazer experimentado pela mente humana ao contar sem dar-se conta de que está a contar". As ligações entre a música e a matemática são muitas e fascinantes, indo desde a relação entre a harmonia e o número que deslumbrou os pitagóricos, até às engenhosa técnicas de repetição e transposição empregues por Bach, Mozart e muitos outros para compor algumas das suas obras-primas.

Opinião: Desta vez a matemática surge ligada à música, neste livro da colecção sobre matemática que tenho por aqui e que, como não podia deixar de ser, me deixou interessado no assunto, apesar de não me ter fascinado como alguns já me fascinaram...

Quer dizer, tem cá todos os elementos que têm os outros, a contextualização histórica impecável, as explicações claras e concisas, e os exemplos bem ilustrativos... Mas falta-lhe qualquer coisa, talvez seja o tema que não me diga muito, ou talvez sejam os autores que não me cativaram muito, mas a verdade é que não achei que fosse nada de tão extraordinário quanto isso.

Ou melhor, é extraordinário, eu é que não achei assim tanta piada, porque é de facto um assunto fascinante, a noção de se conseguir definir a arte, nomeadamente a música, através de processos matemáticos. Mas não me cativou.

Como tal, posso dizer que é um livro interessante, mas talvez mais direccionado para quem esteja mais ligado à música que eu, ou que tenha mais curiosidade sobre os seus aspectos técnicos que eu.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Filhos e Amantes

Título: Filhos e Amantes
Autor: D.H. Lawrence
Tradutor: Cabral do Nascimento

Sinopse: Este clássico de D. H. Lawrence passa-se nas minas de carvão de Nothingham e acompanha a vida da família de Walter Morel, mineiro de profissão. Cansado e desiludido com o seu trabalho, Morel é um homem rude que está frequentemente alcoolizado. A sua mulher, decepcionada com o seu comportamento, acaba por depositar todas as suas esperanças nos filhos, principalmente em Paul, o protagonista do romance. Filhos e Amantes é considerado o primeiro retrato moderno do Complexo de Édipo, estudado por Freud.

Opinião: Esta colecção Não Nobel está a exceder as minhas expectativas de forma estupidamente espectacular. Então neste livro, que eu não sabia bem o que esperar e que me assustou um bocado por ser tão grande (507 páginas), e ter letrinhas tão pequenas. É que isto de andar em época de exames não é brincadeira, e eu já calculava que fosse um livro com uma escrita minuciosa, bastante descritiva, o que diminui bastante o meu ritmo de leitura.

No entanto, e para minha surpresa, lê-se surpreendentemente bem. Não é daqueles livros com uma história mirabolante cheia de peripécias absolutamente inesperadas. É daqueles livros que tem uma história, ponto. Uma narrativa bem contada, gerida com mestria pela mão do autor, que manipula a acção de forma calma e detalhada, entrançando as vidas das várias personagens numa única linha principal que redunda sempre no mesmo assunto: o amor que há entre Paul Morel e a sua mãe, Gertrude.

O rapaz está quase que preso à sua mãe, em virtude do estreito laço que se estabeleceu entre os dois, graças a um pai/marido alcoólico, brutamontes e desrespeitador, que causou uma necessidade de Gertrude encontrar carinho noutro lado, depositando todas as suas esperanças em Paul, o seu rapaz do meio, uma vez que foi aquando do nascimento deste que Walter Morel (o marido abusador) se encontrava numa das suas piores fases.

Ao longo do seu crescimento, Paul é absolutamente devotado à mãe, ao contrário dos seus três irmãos, William, Annie e Arthur, que mais tarde ou mais cedo se desligam da mãe, afastando-se, coisa que Paul não é capaz de fazer. William é ofuscado pela alta sociedade londrina e abandona a família, dando pouca importância aos laços que os unem; Annie acaba por encontrar marido e por se afastar também; Arthur, o mais parecido com o pai, no que toca ao temperamento, toma uma série de decisões irresponsáveis que o afastam a ele também. Por fim, Paul, embora procure activamente pelo amor, e ache por vezes tê-lo encontrado, nunca se sente realmente ligado a outra pessoa que não a sua mãe.

Ou melhor, sente um laço, algo que ele reconhece que devia ser amor, assume que pertence a determinada pessoa, mas não é capaz de a amar de facto e de lhe pertencer mesmo. Tem pavor a sentir-se subjugado por outra pessoa e acha que é precisamente isso que vai acontecer, sempre que se aproxima mais de uma mulher.

A verdade é que este acabou por se tornar num dos melhores livros que já li. A escrita, por estranho que pareça, fez-me lembrar um Júlio Verne romântico, de tão minuciosa e atenta aos detalhes, ou até um Eça de Queirós inglês, substituindo o que é tipicamente português em Eça com aquilo que é tipicamente inglês.

Resumindo, uma boa escrita, uma boa história, um óptimo livro e um óptimo autor, pelos vistos. Aconselho, recomendo, e todos os outros sinónimos que se lembrarem.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Ensaio Sobre a Cegueira


Título: Ensaio sobre a cegueira

Autor: José Saramago

Sinopse: Um homem fica cego, inexplicavelmente, quando se encontra no seu carro no meio do trânsito. A cegueira alastra como "um rastilho de pólvora". Uma cegueira colectiva. (...) Personagens sem nome. Um mundo com as contradições da espécie humana. Não se situa em nenhum tempo específico. É um tempo que pode ser ontem, hoje ou amanhã. As ideias a virem ao de cima, sempre na escrita de Saramago. A alegoria. O poder da palavra a abrir os olhos, face ao risco de uma situação terminal generalizada. A arte da escrita ao serviço da preocupação cívica.

Opinião: Como falar sobre uma obra transcendental? O que me faz pensar que estou à altura de criticar um Nobel da literatura?

Nada, penso. Mas quando um grande homem escreve, é para todos os que o quiserem entender.

É disso exemplo José Saramago e Ensaio sobre a cegueira, lançado em 1995 e adaptado ao teatro e ao grande ecrã.

Demorei bastante tempo a acabar o livro, tendo começado com bastante entusiasmo, mas testes e trabalhos práticos sobrepuseram-se e a leitura foi sendo deixada de lado.

Quando finalmente entrei de férias há cerca de uma semana e meia, decidi recomeçar a ler tudo de novo por respeito tanto ao autor como à obra.

Com esta, duas obras de José Saramago passam a constar da minha biblioteca mental, e penso poder já arriscar afirmar que se trata do meu escritor favorito.

Na verdade, nunca nenhuma narrativa penetrou tanto no meu âmago. Saramago, projecta profundamente em nós a dor, o sofrimento, a mágoa, a ignorância, o medo, o amor.

Em Ensaio Sobre a Cegueira, uma obra extremamente crítica, um abre olhos para a sociedade, todas as fraquezas humanas são exploradas intrinsecamente. A cegueira da humanidade que tristemente a descreve.

Julgo que posso resumir a obra nesta fortíssima citação do final: "Penso que não cegámos, penso que estamos cegos. Cegos que, vendo, não vêem."

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Que as citações nos caiam em cima [8]

Não tenho nada de inteligente ou de engraçado para dizer. Acabei de me deparar com este diálogo, enquanto lia (numa das minhas raras pausas no estudo para os exames), e achei esta parte particularmente digna de vir parar a esta rubrica.

"No limiar do bosque as campânulas haviam invadido o campo, como uma verdadeira inundação. Mas iam já murchando. Clara dirigiu-se para lá. Ele seguiu-a. Aquelas flores seduziam-no.
- Repare, como se escapam do bosque... - disse Paul.
Ela voltou-se, com um movimento de simpatia e gratidão:
- É verdade. - e sorriu.
O sangue dele começou a ferver.
- Faz-me pensar nos homens primitivos que viviam nas florestas, e que deviam horrorizar-se quando se encontravam no espaço livro e descoberto.
- Crê que seria isso? - indagou ela.
- Gostava de saber quais seriam os mais assustados, nessas velhas tribos: se os que, da escuridão das matas, saíam para a luz, ou os que, vindo de fora, entravam pé ante pé na floresta."

D.H. Lawrence, "Filhos e Amantes"

Não sei explicar, acho que gostei da metáfora/imagem/alegoria, o que lhe quiserem chamar. Apreciem.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

O Estranho Caso de Benjamin Button

Título: O Estranho Caso de Benjamin Button
Autor: F. Scott Fitzgerald
Tradutor: Nuno Castro

Sinopse: Benjamin Button é um homem com uma vida ao contrário: nasce como um velho e à medida que vai vivendo, vai rejuvenescendo, o que lhe permite ver a sociedade que o rodeia com um olhar crítico, mas também experimentar uma série de problemas muito diferentes dos do comum dos mortais. Juntamente com a história protagonizada por Benjamin Button, este volume recolhe as outras histórias catalogadas pelo autor como Fantasias, entre as quais se destaca Um Diamante tão Grande como o Ritz.

Opinião: O conto inaugural, Um Diamante tão Grande como o Ritz, é uma pequena surpresa, que me deixou, logo após as primeiras páginas, preparado para um conjunto de histórias completamente diferentes daquela que já tive oportunidade de ler deste autor, TERNA É A NOITE.

O conto é exactamente sobre aquilo que o título indica: um diamante que é tão grande como o Ritz, que faz da família que o possui a mais rica de sempre, apesar de manter tudo no maior secretismo. E é quando um dos membros dessa família convida um amigo para passar o Verão na sua mansão, que esse amigo, tão deslumbrado pelas riquezas à sua volta, não dá conta do perigo em que se vê envolvido.

De seguida vem o conto que dá o título à versão portuguesa do livro (editada numa colecção de "Livros que deram Filmes"), O Estranho Caso de Benjamin Button. Esta pequena história, que deu origem a um filme, protagonizado por Brad Pitt, conta a história de, adivinhem lá, Benjamin Button, que como toda a gente provavelmente já sabe, graças ao filme e à publicidade em seu redor, nasceu velho e morreu novo. Gostei bastante desta narrativa em que o protagonista rejuvenesce, ao invés de envelhecer, o que lhe permite ter uma visão diferente do mundo que o rodeia.

O terceiro conto, O Tarquínio de Cheapside, não passa de algumas páginas de algo que parece um fragmento de um texto maior. É um pequeníssimo conto bizarro e nada explicativo, que peca pela brevidade.

Por fim, o último conto, Ó bruxa do cabelo avermelhado!, é acima de tudo uma história sobre um homem que se conforma, que tem todas as hipóteses e vislumbra todas as possibilidades, mas que se conforma com aquilo que tem e se submete àquilo que for mais fácil, quase que renegando a felicidade.

Resumindo, apesar de ter um registo bastante diferente de Terna é a Noite, este pequeno livro é uma leitura agradável, que tem como grande qualidade (digo eu) as suas histórias estranhas e bastante imaginativas.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Lituma nos Andes

Título: Lituma nos Andes
Autor: Mario Vargas Llosa
Tradutor: Miguel Serras Pereira

Sinopse: Sob a ameaça constante dos guerrilheiros maoístas do Sendero Luminoso, o cabo Lituma e o seu adjunto Tomás vivem num acampamento mineiro das montanhas do Peru, onde inexplicáveis e obscuros desaparecimentos lhes prendem o interesse. Paralelamente, a vida pessoal de ambos - sobretudo o reaparecimento de um antigo amor de Tomás -, intrometer-se-á profundamente na investigação. O drama real das comunidades peruanas, nos anos 80, reféns da organização paramilitar de esquerda, e as dúvidas pessoais dos personagens cruzam-se durante todo o romance, tornando Lituma nos Andes uma obra ímpar no percurso literário de Mario Vargas Llosa, mas também uma das suas mais ferozes críticas à violência estrutural que afectou o Peru durante tantas décadas. Uma obra obrigatória em qualquer biblioteca.

Opinião: A minha curiosidade natural já me tinha permitido descobrir que este autor, o mais recente galardoado com o prémio Nobel da Literatura, escrevia livros com uma forte componente de crítica social, mas nada me tinha deixado preparado para aquilo que encontrei nesta obra.

É com uma linguagem rude e áspera, bastante apropriada ás situações que descreve, que o autor retrata o cenário de violência extrema e sádica que grassava nos Andes.

Lituma é um oficial da guarda-civil destacado para uma aldeola no fim do mundo, Naccos, onde, juntamente com o seu adjunto, Tomás Carreño, vai investigar 3 misteriosos desaparecimentos, embora aquilo que descobre o faça desejar não ter andado à procura...

Com várias narrativas entrelaçadas, sendo até passíveis de confundir quem lê, tal é a brusquidão das mudanças de registo, o autor conta a história de Naccos; a dos desaparecidos; a do adjunto (Tomás ou Tomasito, Carreño ou Carreñito), que sente saudades da mulher da sua vida; a de Dioniso e Adriana, os cantineiros da aldeia, com fama de bruxos e coisas piores; e conta também uma história que serve como pano de fundo a todas estas narrativas, uma história de violência, de revolta, de fanatismo, de tribunais populares e milícias quase militarizadas...

Mario Vargas Llosa é, sem dúvida, um autor a reler.

domingo, 12 de junho de 2011

Memorial do Convento - Novas considerações



Título: Memorial do Convento
Autor: José Saramago

Quando acabei de ler o Memorial do Convento, não fiquei muito bem entendida sobre o seu desfecho, lembro-me até de ter escrito, na minha opinião sobre a obra, aqui no blog, que o fim era um tanto ou quanto subjectivo. "livre das interpretações que cada um faz" disse eu.

Ao estudar a obra nas aulas de Português, percebi finalmente a "subjectividade" que eu atribuíra algures às ultimas linhas daquele extenso livro.

Pois de subjectivo, tem muito pouco ou nada, o amor entre as duas personagens ficcionadas da obra, amor esse inexorável ao tempo, firme, verdadeiro, único, penetrante, supera o inevitável de uma forma mágica e deliciosa, tal como as personagens protagonistas deste sentimento tão fulminante.

Termino por aqui, antes que revele o fim do livro e estrague o suspense  a quem lê ou espera ler o Memorial... Posto isto, reedifico a minha opinião mas só neste aspecto, a subjectividade deu lugar à objectividade mas o encanto e apreciação do livro, mantêm-se intactas sem tirar nem pôr.

Boas leituras!

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Plantas do Metro e Redes Neuronais

Título: Plantas do Metro e Redes Neuronais
Autor: Claudi Alsina

Sinopse: Um grafo é uma construção extraordinariamente simples: são apenas pontos e as linhas que os unem. Um mapa do metro, o percurso de um estafeta e, de um modo geral, qualquer uma das redes de todo o tipo que conformam o mundo contemporâneo são exemplos de grafos. Ao observar cuidadosamente estas estruturas tão simples, abre-se aos nossos olhos um universo de ligações e conexões onde a matemática é rainha incontestada.

Opinião: Um livro interessante, com uma linguagem clara e objectiva, que transmite na perfeição todas as noções matemáticas a que recorre.

Como qualquer livro desta colecção, o assunto é interessante e a forma como este é apresentado é bastante clara e objectiva, graças à linguagem simples que o autor utiliza.

O assunto deste livro é a Teoria de Grafos, que faz uso de esquemas bastante simples, os grafos, para resolver todo o tipo de problemas, mas principalmente os de optimização. E aquilo que é fascinante nos grafos é a sua quase ominpresença por todo o lado, como acontece, aliás, com praticamente toda a matemática.

Neste caso específico temos o exemplo dos mapas do metro, simples conjuntos de linhas e pontos; das redes neuronais, para um exemplo mais natural; e até toda e qualquer cidade, sendo que as suas ruas são as linhas, e as intersecções de duas ou mais ruas são os pontos.

A utilidade deste tipo de esquemas é a de simplificar ao extremo certas situações, o que permite um estudo mais eficiente dos problemas que possam surgir. São frequentemente utilizados para planear actividades, optimizar processos, e têm inclusivamente utilizações a nível das probabilidades.

No fundo, mais um livro interessante de uma boa colecção sobre um tema que cada vez me fascina mais: a Matemática.

domingo, 5 de junho de 2011

Noite Sobre as Águas

Título: Noite Sobre as Águas
Autor: Ken Follet
Tradutor: Sofia Gomes

Sinopse: Em 1939, com a guerra recém-declarada, um grupo de elite embarca no mais luxuoso avião de sempre, o Clipper da Pan American, com destino a Nova Iorque: um aristocrata britânico, um cientista alemão, um assassino e a sua escola, uma jovem em fuga do marido e um ladrão encantador, mas sem escrúpulos. Durante trinta horas, não há escapatória possível desse palácio voador. Sobre o Atlântico, a tensão vai crescendo até finalmente explodir num clímax dramático e perigoso.

Opinião: Quero deixar já bem claro que gostei do livro, mas que fiquei extremamente decepcionado, graças à citação que este traz na capa, da Publishers Weekly: "Follett tece um drama tenso e mortificante no equivalente aéreo do Expresso do Oriente.".

Isto não se faz. Este livro pouco ou nada tem a ver com o brilhante Expresso do Oriente, e embora a maior parte do que eu me lembro seja de ter visto o filme (várias vezes), a verdade é que fiquei à espera de algo tão misterioso, com um final tão chocante com tantas reviravoltas... E afinal não é nada disso.

Não é que seja mau... Este livro é bom. Bastante bom, até. A escrita de Follett é simples, clara e concisa, e o autor vai directo ao assunto, sem devanear muito em reflexões prolongadas das personagens ou em descrições minuciosas dos cenários, limitando-se a dar uma ideia geral dos sítios onde a acção se passa, e introduzindo os pormenores há medida que deles vai precisando. E é realmente um drama tenso, que evolui de forma (relativamente) rápida, embora a parte do mortificante seja bastante mais discutível...

A parte que me aborrece, como já disse, é a citação dizer que este livro é o "equivalente aéreo do Expresso do Oriente". Porque não é. Não há propriamente um grande mistério e não um ambiente de suspense tão acentuado como no Expresso do Oriente, ou em qualquer outro livro de Agatha Christie. A única semelhança que encontro, é na fórmula utilizada, com ligeiras adaptações: uma longa introdução às personagens, e só depois é que começa realmente a história, precisamente ao estilo da rainha dos policiais. Mas as semelhanças acabam aí.

Se bem que, verdade seja dita, talvez a construção e a caracterização de algumas das personagens de Follett sejam melhores do que na generalidade das personagens de Agatha Christie. É óbvio que nenhuma das personagens deste livro chega sequer aos calcanhares de Poirot, e só com algum esforço encontramos alguma coisa ao nível de Hastings, mas estão bem construídas na generalidade, com especial destaque para Eddie Deakin, o engenheiro de voo, que se vê literalmente entre a espada e a parede; e Margaret Oxenford, que enfrenta os seus próprios dilemas existenciais. Estas duas foram claramente as minhas personagens favoritas, Eddie por conseguir agir de forma tão eficaz numa situação tão complicada, e Margaret por ter uma evolução tão demarcada e por ser, no fundo, um espírito revolucionário, que luta contra o pai (fascista!) e contra os obstáculos com uma força tremenda que nem ela sabe bem onde é que vai buscar.

Bem, resumindo, um bom livro, com boas personagens, e uma boa história. Leiam sem medo, mas não acreditem, nem por um segundo, na citação que vem na capa!

sábado, 4 de junho de 2011

Colecção Não Nobel


Colecção Não Nobel - Autores premiados pelo tempo. Provavelmente uma das colecções de livros mais interessantes e apelativas que eu já vi em toda a minha vida. Especialmente tendo em conta que vem com um jornal, que cada livro custa menos de 6 euros, e que têm uma qualidade de edição estupidamente boa.

E isto sem falar da qualidade dos autores e das obras... Autores mais conhecidos, como F. Scott Fitzgerald, graças ao filme O Estranho Caso de Benjamin Button, baseado num conto seu; ou Kafka, autor da Metamorfose, incluindo até (atenção, isto é novidade!), Phillip K. Dick, um dos mestres da Ficção Científica, e Alejo Carpentier, com o seu estilo absolutamente mágico (dizem, que eu não li nada, ainda) e fantasioso.

Mas não são, também há D. H. Lawrence, Mark Twain, Tchékhov, Machado de Assis, Lev Tolstoi, Virginia Woolf, James Joyce, Joseph Conrad e Henry James, além dos mais desconhecidos, ou menos falados, Thomas Hardy, Malcolm Lowry, Máximo Gorki, Nikos Kazantzakis, Robert Musil, Erich Maria Remarque e Raymond Chandler. Enfim, fica aqui a lista dos autores e dos livros:

1 - Terna é a Noite, F. Scott Fitzgerald
2 - Filhos e Amantes, D. H. Lawrence
3 - Judas, o Obscuro, Thomas Hardy
4 - Um Americano na Corte do Rei Artur, Mark Twain
5 - A Estepe, Anton Tchékhov
6 - D. Casmurro, Machado de Assis
7 - Ultramarina, Malcolm Lowry
8 - A Mãe, Máximo Gorki
9 - Os Passos Perdidos, Alejo Carpentier
10 - O Homem do Castelo Alto, Philip K. Dick
11- O Demónio Branco, Lev Tolstói
12 – O Castelo, Franz Kafka
13 – Orlando, Virgínia Woolf
14 – Liberdade ou Morte, Nikos Kazantzakis
15 – Gente de Dublin, James Joyce
16 – Três Mulheres, Robert Musil
17 – Coração das Trevas, Joseph Conrad
18 – Uma Noite em Lisboa, Erich Maria Remarque
19 – À Beira do Abismo, Raymond Chandler
20 – Daisy Miller, Henry James

(tirado daqui, obrigado Be.!)

A colecção vai neste momento com oito volumes saídos, com Os Passos Perdidos, de Alejo Carpentier a sair na próxima quinta, e embora eu ainda só tenha lido o primeiro, Terna é a Noite, de Fitzgerald, não podia estar mais agradado com esta colecção

E o meu interesse nesta colecção prende-se com algo bastante simples: o próprio conceito que une todos estes livros e autores. O elo comum nestes 20 volumes, ou melhor, nos 20 autores destes 20 volumes, é o facto de todos eles serem reconhecidamente merecedores do prémio Nobel e de serem vistos como alguns dos melhores autores de sempre, mas sem nunca terem de facto ganho o prémio, apesar de vários deles terem mesmo sido candidatos, até mais mais do que uma vez!

Mas não é só isso. Eu dizer que são autores que mereciam o Nobel mas nunca o ganharam, se calhar diz-vos poucos. A mim também. Aquilo que me realmente me fascina são os motivos dessa ausência de reconhecimento oficial e formal. Ora era por serem demasiado pessimistas, ora por serem comunistas numa época de luta contra o comunismo, ora por terem opiniões demasiado fortes contra a Igreja, ora por denunciarem certas situações, ora por serem demasiado boémios, ou por terem publicado pouco em vida... Enfim, são autores que os próprios membros da Academia Sueca reconhecem que mereciam ganhar o Nobel, mas que não o ganharam de facto, pelos mais variados motivos.

São verdadeiramente autores premiados pelo tempo, que por serem demasiado fiéis a si mesmos e aos seus ideias, por terem convicções demasiado fortes e demasiado contrárias aquilo que era a regra, ficaram de fora de uma longa lista de laureados com o prémio mais importante do mundo da Literatura. No mínimo fascinante, não?