Autor: Arthur Conan Doyle
Opinião: Já li este livro em português, há cinco anos, mas escrevi uma opinião bastante pobrezinha. O ano passado encontrei uma edição fantástica, com todas as histórias originais desta personagem, por ordem de publicação e em inglês, a desculpa perfeita para voltar a ler Conan Doyle no seu melhor.
Sim, não se deixem enganar pelos outros livros do autor, que são interessantes, é certo, mas não chegam aos calcanhares das suas histórias com Sherlock Holmes. Para ser honesto não posso dizer isto com toda a certeza, que nunca li os romances históricos (mas tenho-os ali!), no entanto acredito que seja verdade.
Aquilo que podem encontrar neste livro é uma história peculiar e uma personagem ainda mais peculiar. Sherlock Holmes é sem dúvida uma das minhas personagens literárias favoritas de sempre (e que será certamente uma das primeiras entradas numa lista de personagens favoritas, como já me pediram aqui para fazer) e uma a que volto vezes sem conta, seja na literatura, no cinema ou na televisão.
Embora o mistério seja interessante, não faz parte do trio de temas de destaque deste livro: a estrutura narrativa, Sherlock, e a sua interação com Watson. Dividido em duas partes, o livro começa por apresentar os crimes e as investigações de Sherlock para ajudar a Scotland Yard, que já não sabe o que fazer. Depois, quando Sherlock descobre tudo e prende o criminoso, inicia-se uma segunda parte, completamente desligada da primeira, em que se conta a história por detrás deste criminoso e dos seus crimes.
Não é algo que se veja em muitos policiais. Normalmente temos acesso a estas histórias prévias contadas pelo próprio criminoso, ou descobertas lentamente pelos protagonistas. Mas Sherlock, tal como o Poirot de Agatha Christie, gosta mesmo é de manter tudo escondido e toda a gente completamente às escuras até chegar a altura de fazer uma revelação bombástica em grande estilo.
Diga Sherlock o que disser, ele gosta da atenção e precisa dos seus pequenos momentos para brilhar.
As personagens estão todas bem caracterizadas, com três além de Sherlock a assumirem uma maior importância: Watson, Lestrade e Gregson. Os últimos dois são inspectores da Scotland Yard, rivais e negligentes quanto às capacidades de Sherlock - excepto quando precisam delas. Watson é um médico militar reformado por lesão, um homem curioso que acaba por partilhar um apartamento com Sherlock.
Mas Sherlock... Que personagem! Os seus poderes dedutivos parecem magia, e se se conseguir desligar o senso comum durante as explicações dele, soam absolutamente fantásticos. Mas os seus outros traços, como a extrema apatia em que cai com frequência, contrastando com os momentos de extrema energia, a sua frieza e distância de tudo e todos, o seu conhecimento profundo de assuntos que lhe interessam, como saber distinguir as cinzas de diferentes cigarros (!) e a sua ignorância profunda quanto a assuntos que não são relevantes para o seu trabalho, como saber que é a Terra que gira em redor do Sol (!!!)... Fascinante!
Homem de muitos ofícios, todos aprendidos e executados por conta própria, Sherlock é uma personagem incontornável e descobre a solução para os crimes aparentemente sem grande esforço. Depois disso é contada a história que levou aos crimes, uma história de coragem, medo, fanatismo, opressão e amor numa comunidade mormon. Esta segunda parte, apesar da ausência das personagens e da história da primeira, não perde o interesse e é a forma perfeita de contar o que se passou.
Devo dizer que ler Arthur Conan Doyle em inglês é muito melhor do que em português. Desta forma é possível reconhecer a voz de Holmes e Watson como o autor queria que elas fossem, e não deturpadas por uma tradução que, por muito boa que seja, deixa sempre escapar qualquer coisa. Aconselho vivamente!
2 comentários:
Por muito que goste das versões actualizadas da história de Sherlock Holmes (Robert Downey Jr é muito cómico e Benedict Cumberbatch dá-lhe uma certa solidão...) odiei o Regresso de Sherlock Holmes publicado pela Europa-América.
É uma colectânea de novelas policiais que nunca mas nunca me agradou; até porque muitas das vezes a magia da sua dedução é algo que não me agrada. Basicamente passa da introdução para o desenlace sem que o meio do conto maior parte das vezes tenha qualquer motivo de existir (Para mim, bastava ler a introdução e ler o final. Ficávamos a perceber a história na mesma.)...
Não sei, mesmo respeitando o pai do género policial literário, este tipo de histórias policiais não me agrada mesmo nada. É sempre a pessoa que menos se espera que é o responsável pela morte... coitados dos polícias se assim fosse... (Atenção que falo também com a pouca experiência de advogado estagiário...)
A versão do Downey Jr. não é o Sherlock, é uma personagem diferente com esse nome, só para vender mais.
(sim, não gosto mesmo nada desses filmes)
O Cumberbatch, on the other hand, é a modernização perfeita.
Esse livro de que falas tem um defeito: o Conan Doyle já não o queria publicar. Ele tinha morto o Sherlock, para se dedicar aos seus romances históricos, mas os fãs queixaram-se (o Conan Doyle devia ser o George Martin da altura) e ele lá o trouxe de volta...
Ou seja, não duvido que essas histórias não sejam das melhores... Mas lê outras coisas, como "O Cão dos Baskervilles", que é impecável, ou contos mais antigos que esses. Tenho quase a certeza que vais apreciar mais.
A magia da dedução, bem, é propositada. Ao contrário da Agatha Christie, que envolvia os leitores nas suas obras e que quase nos obrigava a tentar descobrir tudo primeiro que o Poirot, o Conan Doyle põe-nos mais no lugar do Watson, sem percebermos nada do que se passa.
Repito: dá-lhe mais oportunidades ;)
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