sábado, 20 de setembro de 2014

Estantes Emprestadas [9] - A importância dos juvenis


Esta deve ser a crónica convidada de que mais me orgulho. A autora, Joana Reis, é minha prima. Está no 11º ano e gosto de pensar tenho alguma culpa na sua escolha de área: Ciências.

Descobri há relativamente pouco tempo que partilhamos o gosto pela leitura e pela escrita, além da inclinação científica, portanto nunca mais a larguei. Chateio-a frequentemente com sugestões de leituras, debates sobre Doctor Who - tendemos ambos para fanáticos - e conversas sobre matemática, física, biologia e química.

Aqui há uns tempos pedi-lhe para participar nesta rubrica. Ainda tentou, mas desistiu, por não estar a gostar do rumo da coisa. Voltei a chateá-lo algum tempo depois, pedindo-lhe que explicasse a importância da literatura juvenil, e o resultado é este, uma crónica bem escrita, que aborda bem o tema, e que me conseguiu pôr a mim a ver as coisas por outra perspectiva.

Os meus parabéns Joana, e obrigado. Garanto-te que os leitores aqui do blog vão achar o mesmo que eu. E prometo que volto a chatear-te, quando tiver que repetir convidados!


Nos últimos tempos a literatura juvenil tem sido muito falada por essa internet fora. Mas não pelos melhores motivos. Já li muitos artigos e posts em blogs que dizem que a literatura juvenil não é “literatura verdadeira”. Algumas das coisas que me lembro mais vivamente são que as personagens não têm profundidade, que os problemas das personagens principais são tão fáceis de resolver que gastar um livro inteiro neles se torna ridículo e o facto de serem todos iguais e tratarem todos dos mesmos assuntos e acabarem todos da mesma maneira. Alguns até se questionam “Porque é que os adolescentes gastam tempo nestes livros quando podiam ler algo muito mais filosófico e importante? Há tantos clássicos bons por aí!”.

Ora bem, eu consigo perceber o que estes bloggers querem dizer, percebo o ponto de vista. Mas não concordo, não totalmente.

Desde que comecei a aprender ler, sempre tive livros ao meu dispor. E sempre foi algo que gostei muito de fazer. Mas houve uma altura em que deixei de ler tanto, por motivos desconhecidos. E então, há cerca de dois anos voltei a ter interesse em ler. E como não sabia ao certo o que queria ler tive de fazer uma pesquisa científica muito minuciosa.

Na altura dessa minha pesquisa o filme “Os Jogos da Fome” tinha acabado de sair e eu via montes de gente a falar sobre isso. Acabei por descobrir que se tratava de um trilogia de livros e bing! foram mesmo esses livros que eu comecei a ler. E adorei! E a partir daí foi apenas um pequeno passo para o mundo da literatura juvenil.

“Os Jogos da Fome” e outras trilogias distópicas que estão muito na moda são apenas um pequena parte do mundo dos livros jovens-adultos. Eu gosto muito destas distopias (uma mais que outras) mas também gosto de muitos outros géneros dentro da literatura juvenil, como fantasia, paranormal, steampunk, ficção histórica, ficção científica e o chamado contemporâneo, que é o subgénero em que me vou basear no próximo parágrafo.


Estes livros contemporâneos dentro do género jovem-adulto são aqueles que não têm um elemento fantástico, que tratam de coisas da vida real. Mas porque é que eu como adolescente gosto e leio estes livros? Porque são estes livros que eu escolho ler em vez de me lançar nos clássicos? Porque me consigo relacionar.

Acho que a coisa mais importante destes livros é o facto de que, como estas personagens têm mais ou menos a mesma idade dos leitores, passam por experiências semelhantes. De uma maneira mais direta ou não, os problemas destas personagens são os problemas por que os leitores passam no seu mundo. Desde preocupações com a escola e o futuro, a família, as amizades e cada vez mais começa a aparecer o assunto da homossexualidade.

É normal que pessoas mais velhas leiam estes livros e não se consigam relacionar com as angústias das personagens. Mas para os leitores adolescentes aquilo é de um certo modo a sua realidade.

Na minha opinião é importante passar por esta fase da leitura juvenil (se bem que esta coisa da fase é um pouco relativa, mas isso é outro assunto). 

Falo por experiência própria, estes livros tornaram-se uma parte importante da minha vida e acredito que não seria a mesma pessoa se não tivesse lido certos livros juvenis. Fizeram-me ter um perspetiva diferente não apenas sobre mim mas sobre as pessoas à minha volta. E não é esse um dos objetivos principais dos livros?

Mas este é só o impacto na minha vida pessoal. Na minha “vida literária” estes livros fizeram que eu tivesse curiosidade noutro tipo de livros, como os tais clássicos, alguns dos quais se tornaram alguns dos meus livros preferidos. Preparam-me, depois de uma linguagem simples e direta, para uma linguagem mais complexa.

Então devem as pessoas mais velhas ler livros juvenis? Eu digo que sim, pois este preconceito está a deixa-las passar em branco alguns dos que eu acredito serão os clássicos do futuro.

5 comentários:

Ana/Jorge/Rafa disse...

Perks of Being a Wallflower é sem dúvida um clássico moderno e é literatura juvenil.

Jorge Martins

Rui Bastos disse...

J'accredite. Só tenho pena que coisas como Twilight fiquem como clássicos, também, quer queiramos quer não...

Ana/Jorge/Rafa disse...

Esses é por causa do sucesso, mas daqui a 20 anos já ninguém se lembra do Crepúsculo nem da Meyer, porque tiveram um contributo nulo para a literatura; o Perks, o Harry Potter (não aprecio especialmente, mas tenho de o reconhecer), as cenas do John Green (idem idem, aspas aspas) e assim (por muito que goste deles, acho que os Hunger Games também não ficam para a História) é que serão os clássicos.

Jorge

Rui Bastos disse...

Olha que não sei... Parecendo que não, teve um grande efeito no panorama literário.

Anónimo disse...

A literatura juvenil é para leitores juvenis. Desculpem a redundância, mas acho que importa primeiramente partir desta premissa.

E partindo desta premissa, é pois natural que os problemas juvenis (Acne, os amigos, a escola, os primeiros amores...) surjam neste tipo de livros. Se repararem bem, o forte dos livros de Harry Potter eram estes temas e não apenas a bruxaria restante.

Acho, no entanto, que dizer que não têm a qualidade literária que têm só porque falam destes problemas é algo manifestamente injusto.

Claro que não têm a profundidade dos livros de Primo Levi ou de George Orwell nem a brutalidade cinzenta dos melhores livros de fantasia da actualidade (Grande GRR Martin!).

Mas são este tipo de livros que incentivam os jovens a enverdarem pelo BOM CAMINHO, pelo caminho do gosto pela leitura...

Senão vejamos, a Enid Blyton é reconhecida mundialmente pelo quê? Pelas suas colecções juvenis, certo? Não se pode dizer que Os Cinco ou Os Sete não têm qualidade, quando toda a gente os considera a iniciação ao mundo policiail... É a Enid Blyton má autora?

Quem leu a Ilha do Tesouro, sabe que o autor escreveu um clássico, o mesmo com as obras de Emilio Salgari e de tantos outros... mas um clássico juvenil... nada mais...

Concluido, não se pode quantificar a qualidade de nenhuma obra pelo seu público alvo (Nem mesmo o público que gosta de ler "porno para mamãs"...); porque cada obra é uma obra.

Bom Post!

Francisco Fernande