segunda-feira, 13 de abril de 2015

Seventy-Two Letters


Autor: Ted Chiang


Opinião: Estou a ficar honestamente espantado com Ted Chiang. A velocidade com que se tornou num dos autores de eleição é tremenda. Para um autor que só escreveu contos e novelas, e em nenhum dos casos numa quantidade tão grande quanto isso, é algo de admirar!

Aquilo que vejo em Ted Chiang é uma espécie de regresso à essência da FC como literatura de ideias. Ele consegue pegar em conceitos relativamente simples e criar uma história com princípio, meio e fim à volta deles.

Neste caso usa um conceito parecido com os poderes místicos das letras do alfabeto hebraico e do mito do golem para contar uma história ao mesmo tempo futurista e victoriana (retro-futurista? dar nomes aos géneros é engraçado) sobre andróides e inteligência artificial. E muito mais!

No começo é fácil de imaginar que a história vai ser essencialmente sobre essas duas coisas, o perigo da inteligência artificial e de robots/golems cada vez mais parecidos connosco, mas Chiang introduz muito mais e guia o leitor através da história com uma mestria extraordinária.

Para terem uma ideia, estes andróides são uma espécie de manequins/bonecos que ganham as suas capacidades a partir do nome que lhes é inscrito no corpo, usando combinações de setenta e duas letras. Diferentes combinações significam diferentes capacidades, desde andar, correr, construir outros autómatos e várias outras tarefas específicas.

Mas depois surge também o problema da infertilidade da raça humana. É que no universo desta história, cada homem tem no seu esperma todos os seus descendentes, quais matrioshkas, tal como na teoria do preformationism. A solução é engenhosa, interessante e as consequências também.

A escrita do tipo é fantástica, assim como a forma como desenvolve a história. Maior do que um conto, e portanto mais próximo da novela, esta história é relativamente detalhada e relativamente extensa, mas nunca perde o interesse. O foco da história até varia bastante, mas isso não me impediu de manter o interesse e querer saber o que ia acontecer seguir.

Todas as ideias/noções/conceitos envolvidos são fascinantes e estão bem desenvolvidos, com o autor a dar a devida atenção a cada aspecto da sua história, sem nunca descurar a escrita nem o storytelling. É um balanço delicado que é muito difícil de encontrar e que acho que Ted Chiang já aperfeiçoou.

Também as personagens estão bem conseguidas, realistas e interessantes. Os diálogos são bons, a caracterização também, as interacções também... Enfim, nada a apontar!

Como já disse, todo o desenvolvimento e a própria conclusão da história são qualquer coisa do outro mundo. Incrível, mesmo. Chiang faz um trabalho soberbo a apresentar os vários lados da questão e a apresentar reflexões interessantes, das várias facções, sobre as adversidades das novas tecnologias, do medo que as pessoas sentem em desafiar aquilo que acham que é "a ordem natural das coisas", e tudo o mais.

E sempre com uma escrita e um ritmo fenomenal. A verdade é que este Ted Chiang cada vez me agrada mais, e vou ter que arranjar as colectâneas de contos dele, sem sombra de dúvida. Felizmente há muita coisa disponível na internet, que aconselho que procurem!

Sem comentários: