Autor: Gonçalo M. Tavares
Opinião: Este texto é altamente irregular. Uma das coisas que menos gosto de fazer é opinar a meio de um livro. Posso dizer qualquer coisa, mas nunca uma opinião decente: até chegar à última página muita coisa pode acontecer.
Nas raras vezes em que isto me acontece é por causa de uma de duas razões: ou o livro é extraordinariamente bom (e mesmo assim acabo por me desapontar), ou o livro é extraordinariamente mau (e por esse lado, raramente mudo de opinião). E este, caros leitores, trolls profissionais e pessoas do futuro que andam a ler umas coisas deste blog para descobrirem se sou um psicopata ou não (spoiler: eu é mais sociopatia), este é um livro extraordinariamente mau.
E ainda só li cerca 45%.
Nem sei bem por onde começar... Tenho tanto por onde pegar... Ah, já sei! Que tal começar por dizer que não li um, dois nem sequer três livros deste autor, mas sim quatro, e ainda um conto e algo inclassificável? Pois é, estou novamente a falar com conhecimento de causa.
"Ainda não tens é maturidade para esta escrita invejável!"
Bons olhos o vejam, Sr. Burro da Silva, como vai? Não quero saber. Nem sequer vou fazer de conta que sou simpático consigo, se vem aqui defender o Tavares, aviso-o já de que vai ser trucidado. Pronto, quando quiser, esteja à vontade. Como eu estava a dizer, não estou a dizer nada vindo do ar, e esta crítica é mais uma vez uma crítica informada.
Como tal, avancemos. Este livro foi vendido como uma homenagem e um sucessor aos Lusíadas, e é isso que tenta transparecer por todos os poros: desde o título à edição em capa dura, que lhe dá um ar mais sério e vetusto. A história tem inspirações desse grande épico, está dividida em cantos e escrita em verso, é verdade sim senhor. Mas em vez de homenagem pensem mais em colagem.
É que dizer que este livro é uma homenagem à epopeia de Camões é como dizer que o próximo filme do Michael Bay é uma homenagem a um atentado terrorista qualquer: sim, ambas as coisas só fazem é mal às pessoas nas proximidades, e sim, são ambas igualmente desprovidas de qualquer sentido, mas tirando isso...
Logo à partida, estar em verso ou não estar é igual ao litro. E é preciso muito descaramento da parte de Tavares para escrever o livro com esta estrutura. Basta lerem umas páginas para perceberem que a única coisa que ele fez de diferente relativamente a escrever um livro em prosa foi carregar mais vezes no Enter ou usar folhas mais estreitas. De resto, o verso, que não tem métrica fixa nem rima regular (ou irregular, nada), não serve para absolutamente. Torna-se insultuoso para a obra original, que é uma autêntica ode à capacidade técnica de Camões.
Na prática é o equivalente a eu escrever um livro de poemas, todos ao meu estilo, e assinar cada um com um nome diferente. Já estou a imaginar, O livro triunfal, a maior homenagem a Pessoa e os seus heterónimos. Só que não. É uma mera decisão estilística que foi feita só porque sim, e que ainda por cima conseguiu ser extremamente mal executada.
Depois o que dizer da "história"? A escrita em si nem me aborrece por aí além - tal como em Pessoa(s), encontro algumas passagens que considero dignas de anotar no meu caderno de citações - mas a completa ausência de história em prol de pregos ideológicos que o autor tenta martelar através do meu crânio... Lamento, mas isso dói que se farta.
"Esta juventude de hoje em dia já não sabe apreciar um livro contemplativo, é o que é. Gonçalo M. Tavares é um dos maiores escritores de sempre, tem uma técnica impressionante e um talento imenso, e as obras que escreve são de uma profundidade que os comuns mortais apenas podem imaginar."
Mas tem toda a razão, Sr. Burro da Silva, pelo menos nas duas últimas coisas que disso: o autor realmente tem um talento que me deixa espantado e desapontado por o ver a ser desperdiçado, e os seus livros são odes à profundidade filosófica. Aliás, se a profundidade filosófica se medisse em metros, ia ser preciso inventar uma nova classe de números para medir os livros do Gonçalo M. Tavares.
E o problema é exactamente esse. Os livros são tão, mas tão, mas tão profundos, que sabem o que é que se vê cá de cima, quando se começam a folhear as páginas? Nada.
"Trapaceiro! Ignorante! Tu é que não compreendes o que o autor quer dizer!"
Por uma vez concordamos. Eu sou de facto uma pessoa com inclinação para fazer batota, não sei assim tanta coisa quanto isso, e não compreendo PEVAS daquilo que este autor me quer dizer. A única coisa que retiro dos seus livros, para além das ocasionais citações interessantes, é que estou perante mais um autor que se está a borrifar para os leitores. Ou melhor, que está a cultivar um grupo de leitores muito específico, um grupo intelectual de intelectualidades muito intelectuais, que só são capazes de ler obras que avancem a espécie humana e que estejam rotuladas como OBRAS-PRIMAS, CLÁSSICOS e NOBEL.
É pena. Lá está, acho que o Gonçalo M. Tavares é um dos melhores escritores da actualidade. Mas mantenho-me firme na minha opinião de que é um dos nossos piores autores.
Já se tenho maturidade ou não para para dizer estas coisas, como o Sr. Burro da Silva tão bem questionou ali em cima, a única coisa que vos digo é: se tudo correr bem nunca ninguém vai achar que eu tenho propriamente maturidade suficiente para o que quer que seja. Gosto demasiado de brincar com Legos.