sábado, 27 de julho de 2013

$er um autor


O meu conhecimento do mundo editorial português é quase nulo. Não sei exactamente como funciona, nem qual o processo que vai da entrega de um manuscrito até à distribuição de um livro nas livrarias.

Mas sei que há cada vez mais coisas sinceramente deploráveis a acontecerem nesse campo. Não falo dos livros que vêm em saquinhos coloridos, ou que oferecem velas perfumadas e coisas afins.

Também não falo da vertente comercial glutona que alguns grandes grupos editoriais perseguem com cada vez mais ardor.

E muito menos do facto de existirem bons livros e bons autores que vão ficando fora das opções de publicação, tanto a nível nacional como internacional, por um motivo ou por outro.

Não, não é disso que falo, ainda que sejam 3 coisas que me fazem espécie, com a primeira a ser estúpida, a segunda preocupante, e a terceira perfeitamente normal.

Falo de editoras que publicam mediante pagamento. É complicado conseguir ser publicado, especialmente em Portugal, de certeza, e estas editoras aproveitam esse "nicho": os autores enviam os manuscritos juntamente com um pagamento, e as obras são publicadas.

O resultado é que qualquer macaco publica um livro, por mais terrível e objectivamente mal escrito que ele esteja.

Pode-se argumentar que as edições de autor são basicamente a mesma coisa, mas discordo. Não tenho qualquer problema com edições de autor. Seja por terem sido rejeitados ou pura e simplesmente por quererem o controlo total da sua obra, por despeito ou não ao mundo editorial, uma edição de autor é uma decisão que é tomada por alguém que quer ver o seu livro publicado e ponto final.

O princípio com as editoras de que falo pode ser o mesmo: os autores que aí publicam querem ver-se publicados e ponto final, e para isso estão dispostos a pagar. Tudo bem. A diferença é que nestes casos normalmente saem prejudicados por condições manhosas.

Às vezes não é preciso pagar, basta ceder a totalidade dos direitos de autor. Aceitar coisas destas é estar à beira do desespero e mais vale estar quieto.

E depois há o caso da antologia da Editorial Minerva. Podem ver o blog aqui, e o regulamento aqui. Reparem em como é suposto que este projecto seja "uma referência literária em Portugal e CPLP". E agora reparem em como participar: enviar os textos... e dinheiro.

Portanto temos aqui uma antologia cujo objectivo é ser uma referência literária e isso tudo, e depois tudo o que eu tenho de fazer é escrever algo que se pareça com uma tentativa séria de escrever poesia, juntar-lhe entre 50 a 150 euros, e já está?

Supostamente há uma selecção, mas mesmo que seleccionem os melhores, pelo critério que lhes apetecer, os autores continuarão a ter pago para participar. Pessoalmente acho isto aberrante e errado.

Não sei de mais casos específicos que ache tão absurdos quanto este, mas de certeza que eles andam aí. É uma pena que estas empresas que insistem em dizer que são editoras existam e propaguem estes métodos, mas suponho que seja um sinal dos tempos: uma saída fácil é sempre mais apetecível, por mais batota que envolva.

2 comentários:

Anónimo disse...

Infelizmente, a arte é dos artistas, mas o dinheiro vai para os outros.

Olhe-se o caso histórico de Emilio Salgari. Um homem que criou Sandokan, que criou o Corsário Negro e tantos personagens engraçados e venturosos, tem o nome imortalizado, mas viveu na miséria. Tem uma frase bastante conhecida e tudo: "Os únicos piratas que conheci foram os editores."

Quanto ao facto de apenas pagar para publicar, é triste e impressiona um pouco pela negativa (Impressiona porque o autor e os leitores não percebem que por vezes não têm qualidade e mesmo assim vendem-se estes tristes livros; outras vezes a editora publica quem lhe paga deixando de fora quem tem arte mas não tem dinheiro ou nome.)

No entanto, quero acreditar que qualquer obra de qualidade pode vir a ser publicada. Às vezes também temos que acreditar...

Rui Bastos disse...

É triste de facto. E quanto a acreditar... Nem quero é imaginar quantas obras de qualidade já se perderam...