sábado, 26 de julho de 2014

Estantes Emprestadas [7] - Males de Amor


Por hoje trago-vos uma crónica escrita pela Carolina Leitão, pertencente à primeira vaga de caloiros que apanhei depois de entrar no meu curso e que todos conhecemos, sem qualquer ponta de gozo por ela me caber na palma da mão, por Gaiata.

A Gaiata é uma rapariga especial, porque é mais ou menos minha afilhada no curso. Digamos que sou o padrinho bastardo. O que conheço dela é que é o bípede mais mariquinhas, sentimental e morangos-com-açúcar que já vi, portanto soou-me como a pessoa ideal para um desafio como este: provar-me que o amor é idiota.

Ela não consegui despegar-se das suas raízes, como vão ver, mas tentou e bem! Cumpriu e mostrou, com exemplos literários, que o amor é essencialmente estúpido. Calma, calma, guardem as tochas e as forquilhas, eu sei que não é bem assim, e que os exemplos dados no texto podem perfeitamente ser entendidos com a conclusão oposta, mas o objectivo era mesmo ser desafiante, portanto não quero saber desses pormenores (quase que disse trivialidades).

Fiquem então com o texto. Eu cá estou satisfeito, de resto... Bem, digam-me vocês. Obrigado Gaiata!



Antes de mais começo por dizer que para mim foi um prazer aceitar este desafio. Poderia chamar-lhe qualquer outro nome mas penso que desafio é certamente a palavra indicada uma vez que quem me conhece sabe que sou uma pessoa bastante emotiva e, ainda que racional, se a escolha for entre seguir o coração ou a cabeça é certo e sabido que o coração acaba sempre por sair vitorioso. Ora, podem ver que escrever uma crónica sobre o amor é para mim algo muito complexo, especialmente uma em que tenha de, à falta de uma melhor palavra, o desacreditar. Espero que gostem e que este tema vos faça pensar como me fez a mim.

Amor. Uma palavra tão pequena que descreve um sentimento tão abrangente, pois, afinal existem inúmeras formas de amor. Para mim o amor é aquele calorzinho na barriga que sentimos quando olhamos para a pessoa de quem gostamos, é aquele conforto que sentimos quando pensamos na nossa família, é ainda aquele sorriso que nos aparece estampado no rosto quando estamos com os nossos amigos.


Ao longo da História nem sempre as pessoas foram livres para expressar os seus sentimentos em relação aos outros. Alturas houve em que casar com alguém não era mais do que uma troca de favores ou um mero acordo político, dar as mãos em publico era uma autêntica vergonha e ai de quem ousasse dar um beijinho em público. Hoje em dia atravessamos uma época em que as pessoas têm uma postura exactamente oposta. Se um namorado não der um beijo à namorada em público é porque gosta de homens e se uma rapariga for virgem aos vinte anos de certeza que é porque tem algum problema. 

Como seria de esperar a literatura não foi indiferente a estas mudanças de mentalidade. O evoluir da sociedade quer de uma maneira quer de outra acaba sempre por deixar marcas na arte e na cultura das diferentes épocas.

O primeiro livro de que vos quero falar é das histórias românticas mais conhecidas mundialmente. Romeu e Julieta de William Shakespeare, para aqueles de vós que não conheçam a história, relata o romance de um rapaz e de uma rapariga que se apaixonam perdidamente um pelo outro apesar de as suas famílias se encontrarem em disputa. O resultado desta história trágica é a morte dos dois amantes. Romeu mata-se por pensar que a sua amada estava morta e, Julieta, que se encontrava apenas sob o efeito de uma substância que simulava os sintomas da morte, ao ver que o seu amado tinha tirado a própria vida decide fazer o mesmo. 

Nesta história William Shakespeare demonstra que o amor é capaz de acabar com qualquer disputa pois, apesar do final trágico das duas personagens principais, as famílias de ambos decidem acabar com as suas guerrilhas e viver em paz.


Olhando para os acontecimentos de uma forma sóbria e imparcial deparei-me com as seguintes questões: Será o amor razão suficiente para acabar com a própria vida? Quem no seu perfeito juízo se mata por outra pessoa? Se o Romeu não se tivesse matado pela sua amada estariam os dois vivos e talvez até felizes. Concluí então que o amor não só não é racional como ainda nos faz mal à saúde e pode mesmo levar-nos à morte.

O segundo livro de que vos vou falar chama-se Casa de bonecas de Henrik Ibsen. Esta  peça gerou muita polémica uma vez que abordava o tema da marginalização das mulheres na sociedade numa altura em que nesta ainda não existiam igualdade de direitos. A historia gira em volta de uma assinatura falsificada pela personagem feminina principal, facto que acaba por revelar todos os problemas do seu casamento e levá-lo ao seu fim. 

Este livro levou-me então a fazer uma nova análise do amor: Como é que é possível falsificar um sentimento que supostamente é tão genuíno e tão intenso? Então e se o amor é algo que dura para sempre como é que é possível amar uma pessoa num momento e odiá-la no momento seguinte?  


Pus-me então a pensar nas varias formas de amor que existem na minha vida e nos casos de que já vos falei e apercebi-me que todos eles têm uma coisa em comum: Mais cedo ou mais tarde fazem-nos sofrer! Quantas vezes nos preocupamos com as outras pessoas? Quantas vezes fazemos coisas com as quais não nos sentimos completamente confortáveis apenas para fazer a outra pessoa feliz? Quantas vezes deixamos de por o nosso bem estar em primeiro lugar? Quantas vezes somos enganados por este sentimento?

Posei então a seguinte questão a mim própria : Seria eu capaz de me matar por amor? Fiquei chocada quando percebi que a resposta era sim. Que raio de sentimento é este que nos faz contrariar os nossos instintos primários ao ponto de nos matarmos!? Se Darwin estivesse vivo diria de certeza que a população humana era mal adaptada às condições a que está sujeita e que dentro em breve se iria extinguir. Portanto, o sentimento em que mais acredito é portanto uma palhaçada. Faz-nos felizes num momento mas pode fazer-nos espetar uma faca em nós próprios no outro. 

Decidi então falar-vos da minha última aventura literária, uma saga chamada Memórias de Idhún de Laura Gallego Garcia, uma saga de seis livros que fala acerca de um mundo distante que se encontra dominado por uma espécie de serpentes aladas (sheks) e cujos nativos tentam recuperar a todo o custo. Achei por bem falar-vos desta saga porque tem das historias românticas mais bonitas que já li até hoje. Ao longo dos livros a personagem feminina, Victoria, apaixona-se perdidamente pelo seu melhor amigo, Jack, e pelo inimigo de ambos, Kirtash. 

Sendo das histórias mais bonitas que já li até hoje decidi desafiar-me a mim própria e tentar perceber se também aqui o amor faz das suas. Bem, para começar um triângulo amoroso entre crianças de 15 anos é no mínimo peculiar, ainda para mais se este for tolerado por todas as partes. Em segundo lugar este sentimento idiota faz com que dois inimigos partilhem a mesma rapariga, mais uma vez contrariando todos os instintos primários de sobrevivência apenas por um capricho.

Posto isto sou forçada a concluir que o amor é estúpido e faz-nos agir como se fossemos marionetas a seu belo prazer e a pior parte é que faz com que nós nos contentemos com isso. Não só morremos de amores como o amor nos mata! Mas é por isto mesmo que o amor é tão importante na literatura pois manipula-nos e faz-nos sentir coisas inexplicáveis. Leva-nos a questionar tudo aquilo em que acreditamos e ilude-nos de uma forma completamente flagrante.

Vou então acabar com um aviso: Tenham cuidado com o Amor que ele anda por aí!

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